
No início do século XVII, o debate sobre a verdadeira estrutura do Universo estava ao rubro. Durante séculos, a humanidade seguiu a visão geocêntrica herdada de Ptolomeu, do século II d.C., que colocava a Terra imóvel no centro de tudo. À sua volta giravam sete esferas planetárias e, mais além, encontrava-se o firmamento, repleto de estrelas fixas. Este modelo parecia explicar com sucesso os movimentos do céu e dominava a astronomia e a filosofia natural da época.
Contudo, no século XVI, surgiram ideias que desafiaram esta visão. Tycho Brahe (1546–1601), um dos maiores observadores astronómicos do seu tempo, propôs um modelo intermédio. Nele, a Terra permanecia parada no centro, mas o Sol e a Lua giravam à sua volta, enquanto os planetas restantes orbitavam o Sol. Este sistema tinha a vantagem de conciliar a tradição geocêntrica com algumas novas observações, evitando um confronto direto com a filosofia e a religião dominantes.
Enquanto isso, Galileu Galilei (1564–1642) avançava com uma proposta mais radical: o sistema heliocêntrico de Copérnico (1473–1543). Neste modelo, o Sol estava localizado no centro do Universo, e a Terra — juntamente com os outros planetas — girava à sua volta. Graças ao telescópio que Galileu aperfeiçoou, tornou-se possível observar fenómenos que colocavam em causa a visão tradicional: as luas de Júpiter mostravam que nem tudo girava à volta da Terra, e as fases de Vénus confirmavam que o planeta orbitava o Sol, tal como a sugeria Copérnico.
Em Lisboa, os matemáticos do Colégio de Santo Antão seguiram atentamente estas descobertas. Reconheceram que as observações de Galileu refutaram o modelo de Ptolomeu, mas hesitaram em abandonar a visão geocêntrica. Optaram, assim, pelo sistema de Tycho Brahe, que oferecia uma espécie de “compromisso”: aceitavam as novas evidências astronómicas, mas mantinham a Terra no centro, respeitando a visão cosmológica e religiosa dominante na época.
Este período histórico mostra como a ciência avançou muitas vezes através de um equilíbrio entre inovação e tradição , e como ideias revolucionárias, como as de Galileu, enfrentaram resistência antes de serem aceites pela sociedade. Foi também um momento em que a observação direta da Natureza começou a ganhar mais autoridade do que os textos antigos, abrindo caminho para a ciência moderna.
Galileu, em 1609, construiu um telescópio com cerca de 3 vezes mais de ampliação. Mais tarde, fez versões melhoradas até cerca de 30 vezes de ampliação. Apontar o telescópio pela primeira vez para o céu foi um dos grandes momentos da história da ciência: Galileu fez logo toda uma série de descobertas sensacionais que publicou no Sidereus. A publicação do Sidereus Nuncius causou grande sensação, ao mesmo tempo em que provocava uma controvérsia apaixonada.

Em 25 de agosto de 1609 , Galileu apresentou um dos seus primeiros telescópios — com uma ampliação de cerca de 8 a 9 vezes — aos legisladores de Veneza.
As observações de Galileu ajudaram a consolidar as ideias dos defensores do sistema heliocêntrico de Copérnico , mostrando de forma clara que a Terra não era o centro do Universo. Pouco tempo depois, Johannes Kepler descreveu a óptica das lentes e a dinâmica, um novo tipo de telescópio astronómico com duas lentes convexas, muitas vezes mencionadas como telescópio de Kepler .
Em 1615, o jesuíta português Manuel Dias , que se encontrava na China, escreveu a obra Tien Wen Lueh (Epítome de Questões sobre os Céus), redigida em mandarim. Este pequeno compêndio de cosmografia e astronomia inclui, no final, a descrição — acompanhada de figuras — da nova observação telescópica feita por Galileu em 1609, sobre os “braços” de Saturno .


No dia 22 de junho de 1633, a Inquisição romana obrigou Galileu Galilei a renegar publicamente os modelos cosmológicos que havia defendido e comprovado na sua obra Sidereus Nuncius. Esta obra, que revolucionou a astronomia ao utilizar pela primeira vez observações feitas com telescópio, apresentava evidências claras do sistema heliocêntrico, contrariando a visão geocêntrica então sustentada pela Igreja. Como consequência do seu julgamento, Galileu foi condenado por heresia e obrigado a abjurar das suas ideias.
Além de Galileu, as obras de outros importantes astrónomos como Johannes Kepler e Nicolau Copérnico também foram incluídas no Índex Librorum Prohibitorum — a lista oficial de livros proibidos pela Igreja Católica. Esta lista visava conter a disseminação de ideias consideradas contrárias à doutrina e à autoridade eclesiástica. Só mais tarde, já no século XIX, a proibição dessas obras foi revista, permitindo o avanço do conhecimento científico.

Quadro de José Nicolas Robert Fleury (1797-1890).
Museu de Amsterdão.
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VEIGA, Francisca Branco, Quando Galileu Desvendou os Segredos do Universo: O Telescópio de 1609 (blogue da autora Francisca Branco Veiga). Disponível em: https://franciscabrancoveiga.com/ [30 de agosto de 2025].
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Texto produzido para a criação de um conteúdo audiovisual sobre os jesuítas portugueses astrónomos na China do século XVII. Este excerto integra o audiovisual concebido para ser apresentado numa exposição no Observatório Astronómico de Pequim.
VEIGA, Francisca Branco – Criação de conteúdo audiovisual dedicado aos jesuítas portugueses astrónomos na China setecentista, para exposição no Observatório Astronómico de Pequim (excerto).