Seremos conhecidos para sempre pelas pegadas que deixamos.
Menu
Widgets
Pesquisar
Autor: Francisca Branco Veiga
Francisca Branco Veigahttps://franciscabrancoveiga.wordpress.com/Doutora em História Contemporânea pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, com o tema “A Restauração da Companhia de Jesus em Portugal, 1828 – 1834. O breve regresso no reinado de D. Miguel”.
Mestre pela Universidade Católica de Lisboa, em Património Cultural de Matriz Cristã, com especialização na área de Museologia, subordinado ao tema “Noviciado Da Cotovia - O Passado Dos Museus Da Politécnica, 1619-1759”.
Investigadora do Centro de História da Universidade de Lisboa (CH-ULisboa).
Os seus interesses de investigação estão centrados na história política e religiosa da época Moderna e Contemporânea em Portugal.
A museologia e a criação e organização de atividades pedagógicas e visitas orientadas fazem parte do seu percurso profissional, mas acima de tudo da sua paixão pela História na vertente educativa e cultural.
«A revolução de 1820 previa uma viragem na política portuguesa, mas o liberalismo constitucional foi interrompido pelo absolutismo miguelista em 1828. Na defesa da união entre a monarquia absoluta e a instituição eclesiástica, e tendo como retaguarda a bandeira da Santa Aliança, D. Miguel chama os jesuítas como «bons formadores» e «educadores das mentes e das consciências» da juventude, baseados nos ideais que a tradicional monarquia ambicionava, isto é, uma sociedade legitimadora do status quo, com princípios sociopolíticos estáticos e que não contrariasse os princípios da fé que a Igreja Católica Romana estatuíra.
Com base num percurso histórico evolutivo e na relação de pura reciprocidade entre o rei D. Miguel e os jesuítas, este livro procura responder a quatro questões chave: Quais as razões que estiveram na origem do regresso da Companhia de Jesus a Portugal? Que propósitos e objetivos servia este regresso? Que impactos teve a reinstalação dos missionários jesuítas? Que razões determinaram a segunda expulsão?»,
A história desenrola-se em torno do rei D. Miguel e da Companhia de Jesus, numa relação de pura reciprocidade. Contudo, que razões determinaram a expulsão de ambos de Portugal? Aqui surge a figura de D. Pedro de Bragança, Imperador do Brasil, irmão de D. Miguel.
A alteração da conjuntura na Europa dos anos 30 foi marcada pela subida ao trono de um «rei burguês» na França, pela mudança do ministério inglês para tendências liberais, e pela subida ao trono da regente D. Maria Cristina, de Espanha. O tratado da Quádrupla Aliança, assinado em 22 de abril de 1834, em Londres, entre estes três países e os liberais portugueses, constitui-se como oposição clara à Santa Aliança e que irá contribuir para a vitória dos liberais portugueses e a expulsão de Portugal de D. Miguel.
Os emigrados liberais em Inglaterra demonstravam continuamente a sua revolta contra a «usurpação» do governo de D. Miguel e a sua indignação perante o retorno dos jesuítas a Portugal, e especificamente a entrega do ensino a esta Ordem.
No dia 22 de abril de 1834, a Quádrupla Aliança decide-se pela intervenção militar contra as forças do rei D. Miguel I visando impor regimes liberais nas monarquias ibéricas e em 16 de maio, na batalha de Asseiceira, D. Pedro derrota as forças absolutistas de D. Miguel, assegurando os direitos de sua filha D. Maria da Glória e garantindo a vigência de uma Constituição liberal.
Pelo decreto de 28 de maio de 1834 D. Pedro, em nome de sua filha, futura D. Maria II, extinguiu todas as Ordens Religiosas masculinas. As Congregações religiosas foram o alvo principal da atuação dos liberais, começando por expulsar novamente os jesuítas que, organizados segundo o estatuto canónico da Missão Portuguesa da Companhia de Jesus, eram considerados “o braço armado” do Papa.
A partir de três elementos, dois retratos de D. Miguel e D. Pedro respetivamente, e do monograma da Companhia de Jesus, pedi à designer Rita Machado que desenhasse esta capa, porque nesta história estas duas personagens e esta instituição religiosa são causa e consequência de toda a trama que se desenrolou entre 1828 e 1834, e na guerra que se manifestou entre estes dois irmãos, um conservador e um liberal.
A Batalha de Waterloo, em 1815, marcaria definitivamente o fim da Era Napoleónica causando, de modo consequente, mudanças políticas, sociais e económicas em toda a Europa. Um acordo entre os países vencedores (Império Austríaco, Império Russo, Prússia e Grã-Bretanha) contribuiu para o restabelecimento da paz e estabilidade política na Europa.
Battle of Waterloo. William Sadler.
Pyms Gallery
Assim, no Congresso de Viena (entre 11 de novembro de 1814 e 9 de junho de 1815) reorganizaram-se as fronteiras europeias afetadas pelas conquistas de Napoleão, restauraram-se «as velhas casas dinásticas», procurando-se um «equilíbrio geoestratégico entre um Directório ou Pentarquia de potências»[1].
O Congresso de Viena em 22/06/1815: o bolo dos reis. Reuniu as oito potências mundiais e procurou redefinir as fronteiras após a queda do Império de Napoleão I. Alexandre I, Czar da Rússia; R. H. Stewart, Castlereagh; François José I, Imperador de Au · Musee de la Ville de Paris, Musee Carnavalet, Paris, France.
A expansão napoleónica pela Europa revelara-se um perigo para o sistema legitimista, confessional e aristocrático, uma ameaça para a Europa dos reis. Deste modo, o Congresso de Viena teve três objetivos fundamentais, necessários para se estabelecer um equilíbrio entre as grandes potências vencedoras de Napoleão[2]:
1) a restauração do Antigo Regime e do absolutismo: grande preocupação das monarquias absolutistas uma vez que se tratava de recolocar a Europa na mesma situação política em que se encontrava antes da Revolução Francesa dado que esta havia terminado com os privilégios reais e instituído o direito legítimo de propriedade aos burgueses;
2) o regresso das dinastias depostas pela política expansionista de Napoleão Bonaparte, defendido sobretudo por Talleyrand que garantia com isso o retorno dos Bourbon ao poder com a aprovação dos vencedores. Assim, após 1815, voltam a subir ao trono os Bourbon em Nápoles e em Espanha, a dinastia de Orange nos Países Baixos, assim como se mantem a dinastia dos Habsburgo, em Viena, símbolo da ordem tradicional do Antigo Regime. Em Portugal, os Bragança tinham transferido a corte portuguesa para o Brasil em 29 de novembro de 1807 de onde regressam em 1820;
3) o restabelecimento do equilíbrio político-militar entre os estados europeus, embora com ascendência de uns face a outros, promoveu a preservação da paz.
Houve uma tentativa de retorno à velha ordem. Mas a restauração não conseguiu restabelecer inteiramente a situação de 1789. O mapa europeu foi muito simplificado e o número de Estados ficou reduzido. Os vencedores saíram da guerra engrandecidos, a Grã-Bretanha expandiu-se dentro e fora da Europa e as três potências continentais (Rússia, Prússia e Áustria) cresceram dentro da Europa[3].
No futuro próximo esta partilha da Europa irá produzir descontentamentos entre os Estados que foram sacrificados por um “equilíbrio europeu” realizado em proveito das grandes potências.
A Liberdade Guiando o Povo, quadro no qual Delacroix mostra a revolta da população parisiense, que, mobilizada pelas idéias liberais, em 1830, sai às ruas para pôr fim ao absolutismo.
Numa grande parte da Europa, porém, os ideais da França revolucionária tinham deixado sementes, continuando a subsistir uma corrente liberal que era apoiada por fações da sociedade, e que atuavam como força de contestação às monarquias restauradas em 1815. Tal como afirmou Theodoros Kolokotronis (1770-1843), marechal de campo e herói grego, “a Revolução Francesa e os feitos de Napoleão abriram os olhos ao mundo. Antes disso, as nações nada sabiam, e o povo pensava que os reis eram deuses sobre a terra e que era obrigado a dizer que aquilo que estes fizessem era bem feito. Devido a esta presente mudança, é mais difícil governar o povo” [4].
[1] SARDICA, José Miguel – A Europa Napoleónica e Portugal. Lisboa: ed. Tribuna, 2011, p. 55. Veja-se, inclusive, BONIFÁCIO, Maria de Fátima – Seis Estudos sobre O Liberalismo Português. Lisboa: Ed. Estampa, 1991, pp. 297-303 (O Concerto Europeu ou a Europa das Potências).
[2] Veja-se DUROSELLE, Jean Baptiste – A Europa de 1815 aos nossos dias: vida política e relações Internacionais. São Paulo: Pioneira, 1976, pp. 4 e ss.; CORREIA, Maldonado – “O Congresso de Viena – Fórum da Diplomacia Conservadora no Refazer da Carta Europeia”. In Nação e Defesa, Ano XIX, nº 69, jan-mar 1994, pp. 40-41.
[3] RÉMOND, René – iIntrodução à História do Nosso Tempo: do Antigo Regime aos nossos dias. Lisboa: ed. Gradiva, 1994, pp. 139-144.
[4] HÄBICH, Theodor – Deutsche Latifundien. Stuttgart: W. Kohlhammer, 1947, pp. 27 e ss.. Apud HOBSBAWM, Eric J. – A Era das Revoluções, 1789-1848. 5ª ed.. Lisboa: ed. Presença, 2001, p. 99.
Hoje é um dia muito especial para mim, é o dia em que o meu livro ‘Companhia de Jesus O breve regresso no reinado de D. Miguel‘ é finalmente publicado.
É uma honra poder partilhar a minha pesquisa com o mundo, e que representa anos de muito trabalho e paixão pela história de Portugal. Espero que esta obra possa proporcionar uma experiência de leitura agradável e informativa.
O livro conta com o Prefácio do Prof. Doutor Miguel Corrêa Monteiro, Vice-Presidente da Academia Portuguesa da História, Professor Auxiliar com Agregação no Departamento de História e Coordenador do Mestrado em Didáctica da História, na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.
É um dos símbolos mais antigos da Páscoa. Lembra a aliança que Deus fez com o povo judeu no Antigo Testamento.
Naquela época, a Páscoa era celebrada com o sacrifício de um cordeiro.
Para os cristãos, Jesus Cristo é o “cordeiro de Deus que tirou os pecados do mundo”(João 1:29)
“Retábulo de Ghent”, composto por 12 painéis, considerado a primeira grande pintura a óleo a ganhar admiração mundial. Ao centro inferior, a “Adoração do Cordeiro Místico”, pintada pelos irmãos Van Eyck, em 1432. KIK-IRPA, Brussels, Belgium (o retábulo do altar de Ghent começou a ser pintado em 1420 por Hubert van Eyck, morto seis anos depois, sendo terminada por seu irmão mais novo Jan, em 1432).
Mensagem de João Paulo II para o XL Dia Mundial de Oração pelas Vocações
11 de maio de 2003 – IV Domingo de Páscoa
TEMA: A Vocação ao Serviço
Venerados irmãos no Episcopado Caríssimos Irmãos e Irmãs de todo o mundo!
2. …“Como um cordeiro conduzido ao matadouro…” (Is 53,7).
Na Sagrada Escritura existe uma forte e evidente relação entre o serviço e a redenção, assim como entre serviço e sofrimento, entre Servo e Cordeiro de Deus. O Messias é o Servo sofredor que carrega sobre os ombros o peso do pecado humano, é o Cordeiro “conduzido ao matadouro” (Is 53,7) para pagar o preço das culpas cometidas pela humanidade e prestar, deste modo, o serviço de que ela mais precisa. O Servo é o Cordeiro que “foi maltratado, mas livremente humilhou-se e não abriu a boca” (Is 53,7), mostrando, assim, uma extraordinária força: aquela de não reagir ao mal com o mal, mas de responder ao mal com o bem.
É a mansa determinação do servo, que encontra em Deus a sua força e por Ele, exactamente por isto, se torna “luz das nações” e operador de salvação (Is 49,5-6). A vocação ao serviço é sempre, misteriosamente, vocação a tomar parte de modo muito pessoal, também árduo e sofrido, no ministério da salvação.
Sacrário Cordeiro
Homilia de Bento XVI na missa de inauguração do Pontificado.
SANTA MISSA
IMPOSIÇÃO DO PÁLIO E DO ANEL DE PESCADOR PARA O INÍCIO DO MINISTÉRIO PETRINO DO BISPO DE ROMA
HOMILIA DE SUA SANTIDADE BENTO XVI
Praça São Pedro
Domingo, 24 de Abril de 2005
“… O símbolo do cordeiro tem ainda outro aspecto. Era costume no antigo Oriente que os reis se designassem a si mesmos como pastores do seu povo. Esta era uma imagem do seu poder, uma imagem cínica: para eles, os povos eram como ovelhas das quais o pastor podia dispor a seu bel-prazer. Pelo contrário, o pastor de todos os homens, o Deus vivo, fez-se ele mesmo cordeiro, pôs-se do lado dos cordeiros, dos que são pisados e sacrificados. É exactamente assim que Ele se revela como o verdadeiro pastor: “Eu sou o bom pastor […]. Eu dou a minha vida pelas ovelhas”, diz Jesus de si mesmo (Jo 10,14).
Não é o poder o que redime, mas o amor! Este é o sinal de Deus: Ele mesmo é amor. Quantas vezes desejaríamos que Deus se mostrasse mais forte! Que Ele castigasse duramente, que abatesse o mal e que criasse um mundo melhor! Todas as ideologias do poder justificam-se desta forma, justificam a destruição do que se opõe ao progresso e à libertação da humanidade. Nós sofremos pela paciência de Deus. E, não obstante, todos necessitamos da sua paciência. O Deus, que se fez cordeiro, diz-nos que o mundo se salva pelo Crucificado e não pelos crucificadores. O mundo é redimido pela paciência de Deus e destruído pela impaciência dos homens.
Uma das características fundamentais do pastor deve ser amar os homens que lhe foram confiados, tal como ama Cristo, ao serviço de Quem está. “Apascenta as minhas ovelhas”, diz Cristo a Pedro, e a mim, neste momento. Apascentar quer dizer amar, e amar quer dizer também estar dispostos a sofrer. Amar significa dar às ovelhas o verdadeiro bem, o alimento da verdade de Deus, da palavra de Deus, o alimento da sua presença, que Ele nos dá no Santíssimo Sacramento…”
Representação românticado Cordeiro de Deus na capela de St. Remigius
Cordeiro Pascal c. 1660-70, óleo sobre tela 88 x 116 cm Museu Regional Évora, Portugal
O Cordeiro
O Cordeiro simboliza Cristo, que é o filho e cordeiro de Deus, sacrificado em prol de todo o rebanho (humanidade). Embora tido como símbolo da Páscoa cristã, o cordeiro já era muito importante na Páscoa judaica e nos cultos Teutónicos, onde era frequente o sacrifício de animais aos deuses.
O sentido dos sacrifícios do Antigo Testamento e o Sacrifício de Cristo
Os hebreus tinham o costume de matar um cordeiro em sacrifício a Deus, para remissão dos pecados. O sacrifício de animais (ou mesmo de pessoas) era frequente entre vários grupos étnicos, em várias partes do mundo. Na Bíblia é referido, por exemplo, o caso de Abraão que, para provar a sua fé em Deus teria de sacrificar o seu único filho, imolando-o e queimando-o numa pilha de lenha, como era costume para os sacrifícios de animais – o relato bíblico refere, contudo, que Deus não permitiu tal execução e em seu lugar foi-LHE oferecido um cordeiro. Mas o cordeiro adquire um significado especial na Páscoa dos judeus. Na ceia do Egipto, eles aspergiam com o sangue de um cordeiro os umbrais das portas para que o anjo exterminador, vendo o sangue, poupa- se os primogénitos dos israelitas. E cada ano, celebrando a Páscoa, as famílias dos hebreus comiam o Cordeiro pascal em comemoração à libertação do Egipto. O cordeiro tornou-se um símbolo de libertação e de vida de um povo. O sentimento que brota mais fortemente de todos estes sacrifícios é o da obtenção do perdão dos pecados. No Novo Testamento os evangelistas vão usar a imagem do cordeiro para significar o Messias. Jesus reunifica num único sacrifício, toda esta busca de reconciliação e intimidade com Deus.
A Eucaristia é a novidade definitiva do sacerdócio de Jesus Cristo.
O Cordeiro de Deus sobre o Livro dos Sete Selos. Obra de Johann Heinrich Rohr, cerca de 1775
A identificação de Jesus com o cordeiro pascal da liturgia judaica.
S. João Baptista tinha apontado Jesus como o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo –“ No dia seguinte João viu a Jesus, que vinha para ele, e disse: Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo” (Jo 1, 29). Na nova liturgia da Nova Aliança, Cristo é o verdadeiro Cordeiro Pascal, sem defeito, nem mancha, imolado para selar com o Seu sangue a Aliança definitiva. S. Paulo confirma esta interpretação – “Alimpai-vos, pois, do fermento velho, para que sejais uma nova massa, assim como estais sem fermento. Porque Cristo, nossa páscoa, foi sacrificado pornós”(1 Cor 5, 7). Torna-se claro que Jesus se tornou o Cordeiro Pascal, cumprindo a missão do Servo. Tal como estava prescrito na liturgia judaica, ao cordeiro pascal não se deveria partir nenhum osso. Segundo S. João, é para cumprir esta prescrição que os soldados não quebrarão as pernas a Jesus, já morto –“ Mas, vindo a Jesus, e vendo-o já morto, não lhe quebraram as pernas”(Jo 19, 33).
Para a Igreja apostólica Jesus é o novo Cordeiro Pascal, situando assim, a Eucaristia como realização plena da Ceia pascal judaica, enquanto libertação da escravidão do pecado. O Apóstolo S. Pedro afirma-o – “Sabendo que não foi com coisas corruptíveis, como prata ou ouro, que fostes resgatados da vossa vã maneira de viver que por tradição recebestes dos vossos pais, 19 Mas com o precioso sangue de Cristo, como de um cordeiro imaculado e incontaminado…”(1 Ped 1, 18-19).
A morte de Jesus Cristo, considerado pelos cristãos como filho unigénito de Deus, tornaria os sacrifícios desnecessários, já que sendo considerado perfeito, não tendo pecado e tendo nascido de uma virgem por graça do Espírito Santo, semelhante a Adão antes do pecado original, seria o sacrifício supremo, interpretado como o maior acto de amor de Deus para com a humanidade.
Na última ceia, Jesus institui o Sacramento da Eucaristia. Nesta, Jesus concretiza o que anunciara ser: o Cordeiro Pascal; o Cordeiro de Deus, convertendo o pão e o vinho no Seu Corpo e Sangue – O Sacramento da Eucaristia.
Na II Leitura (1 Cor 11, 23-26) S. Paulo diz:
“23 Porque recebi do Senhor o que também vos entreguei: que o Senhor Jesus, na noite em que foi traído, tomou o pão;
24 e, tendo dado graças, partiu-o e disse: Isto é o meu corpo, que é dado por vós; fazei isto em memória de mim.
25Por semelhante modo, depois de haver ceado, tomou também o cálice, dizendo: Este cálice é a nova aliança no meu sangue; fazei isto, todas as vezes que o beberdes, em memória de mim.
26Porque, todas as vezes que comerdes este pão e beberdes o cálice, anunciais a morte do Senhor, até que ele venha.”
Narração da instituição da Eucaristia: “…Isto é o meu Corpo entregue por vós…Este cálice é a Nova Aliança do meu sangue.”
Agnus Dei
Trata-se de uma expressão latina utilizada pela religião cristã para se referir a Jesus Cristo, identificado como o salvador da humanidade, ao ter sido sacrificado em resgate pelo pecado original. Na arte e na simbologia iconográfica cristã, é frequentemente representado por com um cordeiro com uma cruz. A expressão aparece no Novo Testamento, principalmente no Evangelho de S. João, onde João Baptista diz de Jesus: “Eis o Cordeiro de Deus, Aquele que tira o pecado do mundo” (João 1:29).
Objecto de devoção
Agnus Dei é por vezes representado por uma pequena peça, geralmente em metal dourado, em forma circular, que costuma ser usada por católicos como sinal da protecção divina.
Na liturgia católica o Agnus Dei é recitado ou cantado durante o início da fração do pão eucarístico. Introduzida na missa pelo Papa Sérgio I (687-701) e baseada em João 1: 29, “…No dia seguinte, viu João a Jesus, que vinha para ele, e disse: Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo!..”, a forma latina é:
Agnus Dei, qui tollis peccata mundi, miserere nobis. Agnus Dei, qui tollis peccata mundi, miserere nobis. Agnus Dei, qui tollis peccata mundi, dona nobis pacem.
Cordeiro de Deus, que tira os pecados do mundo, tende piedade de nós. Cordeiro de Deus, que tira os pecados do mundo, tende piedade de nós. Cordeiro de Deus, que tira os pecados do mundo, dai-nos a paz.
Na música sacra, muitos compositores realizaram verdadeiras obras-primas para esta parte da missa.
Quando a missa é deréquiem, este trecho recita-se ou canta-se da seguinte forma:
Agnus Dei, qui tollis peccata mundi: dona eis requiem. Agnus Dei, qui tollis peccata mundi: dona eis requiem sempiternam.
Não tendo como pretensão o estudo aprofundado da iconografia na Companhia de Jesus, achei conveniente mostrar que um programa cultual e de doutrinação teve como consequência a criação de uma arte religiosa muito própria da Companhia de Jesus ao nível da arquitetura, da pintura, da escultura, da ourivesaria.
1619 – Inauguração do noviciado da cotovia – Encontramo-nos num período de reforma católica referido como Contra-reforma que se caracterizou por um movimento de reafirmação dos princípios da doutrina e da estrutura da Igreja Católica, diante do movimento de Reforma Protestante na Europa do século XVI. O Papa Paulo III convocou este concílio para assegurar a unidade de fé e a disciplina eclesiástica.
Na última sessão do Concílio de Trento (1545 – 1563), definiu-se de forma explícita e intencional que a arte deve estar ao serviço dos ritos da igreja católica.
Dos decretos tridentinos transparece uma nova forma de ver a imagem sagrada, onde o “ver” uma coisa com desejo e com intenção equivalia a possuí-la.
A Companhia de Jesus nasce, neste período, como um instrumento na definição do ideal de uma Igreja reformada.
4. História do noviciado
O noviciado da Cotovia surge da necessidade de se criar um espaço único para a formação de noviços destinados ao oriente para evangelizar.
Em 1540 D. João III irá ser o primeiro rei na Europa a contactar Inácio de Loyola devido à necessidade de encontrar missionários, homens letrados, para evangelizar o Oriente, pregando e convertendo à Fé cristã os nativos
Surge a figura de Fernão Teles de Meneses benemérito que doou toda a sua fortuna para a construção deste noviciado, virado para o Tejo de onde se via os barcos partirem. Com bons ares e fora das muralhas fernandinas.
Entram os primeiros noviços em 1619 e são expulsos deste espaço em 1759.
Ocuparam este espaço durante 140 anos, ligados ao ensino e formação de jovens destinados às missões do oriente.
5. Enquadramento religioso e artístico
Relativamente à Companhia de Jesus esta rapidamente respondeu a esta igreja reformada.
Foram várias as contribuições para que se possa falar de um “estilo jesuítico”: Ao nível interno, as Constituições, A Formula do Instituto, a auto biografia de Sto Inácio de Loiola, tal como, os Exercícios Espirituais; a nível externo, o Concílio de Trento, as Instrução de S. Carlos Borromeu ou o Tratado de São Roberto Belarmino.
Estas, São as linhas essenciais que vão configurar a prática cultual e devocional e que vão ditar iconograficamente toda a Arte.
A vida cultual é regrada e normalizada de acordo com o tipo de indivíduo.
A prática devocional da Companhia orienta-se, de forma clara, em quatro vertentes: Trinitária, Cristológica, Mariana e Hagiográfica
Deste modo, estes religiosos conseguiram interpretar os princípios estéticos vigentes no mundo católico pós reforma.
6. Tipologia da Coleção
O espólio do noviciado é composto por sessenta peças, essencialmente, objetos que serviram ao culto na Igreja de Nossa Senhora da Assunção, enriquecido com alguns paramentos que vieram da China e relicários de Itália.
Ao espólio do noviciado da Cotovia que se encontra no Museu Nacional de História Natural e da Ciência, poderíamos adicionar pinturas e esculturas da igreja do antigo noviciado dispersas em diversas instituições de Lisboa
7. PINTURA FTM
Encontramo-nos no período de governação espanhola. FTM a 3 de Novembro de 1581 jurou e fez jurar o novo rei Filipe I em todo o estado da Índia.
Assim, ao observarmos o estilo de pintura aplicado no retrato sentimos que esta se aproxima da tradição tenebrista espanhola, da utilização pictórica do claro-escuro, como pintura de aparato e de representação. Iconograficamente muito ligado ao período filipino, pois tem como indumentária uma armadura filipina.
Muito idêntica à dos pintores Bartolomé González e Juan Pantoja de la Cruz .
Na tradição do retrato tem-se o cuidado de mostrar cuidadosamente rendas, vestidos e joias dos seus modelos, com postura rígida, e colocando um fundo de aparato. As mãos também são desenhadas com precisão, segurando um bastão, símbolo de comando. A luva destacada serve de reconhecimento da sua posição de Governador. Com Cruz de Cristo ao peito. Nesta tela visualiza-se os dois mundos de Fernão Teles de Meneses, o de guerreiro e o de político. É visível ao nível pictórico um desequilíbrio, mostrando uma pintura excelente na totalidade mas ao nível da feições a qualidade não é a mesma, denotando que provavelmente foram duas pessoas a pintá-la.
8. ESCULTURA TUMULÁRIA
Foram as sepulturas régias da capela-mor de Santa Maria de Belém que deram início a um conjunto de monumentos funerários tipologicamente idênticos
Na Capela-mor das Igrejas da Companhia de Jesus encontramos sempre o túmulo do fundador, conforme impunham as Constituições (309-310), além de testemunhar o sentimento de gratidão à figura benemérita do Fundador (312-314.
Existem duas ordens de razões para a grande aceitação deste tipo de fórmula: por um lado, o prestígio associado a monumentos fúnebres régios, e, por outro, o facto de a realização deste modelo não implicar, a nível técnico, a necessidade de grandes recursos ou apresentar particulares dificuldades.
Nível formal – composto por essas e suporte
Nível simbólico
Ásia simbolizava o poder real
arte oriental o elefante como elemento de suporte é simbólico de animal-suporte-do-mundo: o universo repousa sobre o lombo de um elefante.
Ocidente simbolizava eternidade, temperança, piedade, associadas à soberania, ao poder e à riqueza.
Nível técnico – não implica grandes recursos manuais e de especialidade.
O que cativou a realeza e a nobreza por este tipo de sepultura terá sido o seu aspeto em pirâmide e o material utilizado (mármores).
9. ESCULTURA
As esculturas do noviciado da cotovia seguem as normas saídas do Concílio de Trento, refere-se à Invocação e Veneração às Relíquias dos Santos e das Sagradas Imagens da seguinte maneira:
“…declara este santo concílio, que as imagens devem existir, principalmente nos templos, principalmente as imagens de Cristo, da Virgem Mãe de Deus, e de todos os outros santos, e que a essas imagens deve ser dada a correspondente honra e veneração…» e «…que as imagens não sejam pintadas com formosura dissoluta…”.
“… se consegue muitos frutos de todas as sagradas imagens, não apenas por recordarem ao povo os benefícios e dons que Cristo lhes concedeu, mas também porque se expõe aos olhos dos fiéis os salutares exemplos dos santos milagres que Deus lhes concedeu,”
Santo Inácio nos Exercícios Espirituais (47), propõe o uso da visão e da imaginação como um recurso para que a oração se torne concreta. “…ver, com a vista da imaginação, o lugar material onde se acha aquilo que quero contemplar…”
As esculturas do noviciado da Cotovia são maneiristas, do início do século XVII, fidelizadas a parâmetros de imaginária sacra portuguesa, tipo esculturas de Gonçalo Rodrigues que trabalhou para uma clientela religiosa e tradicionalista.
A escultura é representada com equilíbrio e síntese no tratamento volumétrico, com serenidade expressiva e gestual.
A escultura da Virgem com o Menino Salvador do Mundo é uma imagem de vulto, em madeira de carvalho setentrional, estofada e policromada, apresentando grande delicadeza na sua postura.
A escultura de S. Paulo, com estofo em tons vermelho e verde e com vestígios de policromia floral e geométrica, com desenho de linha a dourado. Simbolicamente, teria uma espada aludindo ao seu martírio, pois foi decapitado, mas também é símbolo da palavra divina por ele anunciada, como diz a Carta aos Hebreus: “a palavra de Deus é viva e eficaz, mais penetrante que uma espada de dois gumes” (Hb 4, 12). Existem referências ao local onde se encontrava: Na sacristia encontrava-se «…em cima do caixão duas imagens de vulto, uma de S. Pedro, outra de S. Paulo, ambas de cinco palmos com resplendores de folha prateada…».
A escultura de Cristo estaria na sua origem atado a uma coluna. Esta imagem está associada à flagelação de Cristo. A cena da Flagelação, tal como os outros episódios da Paixão é, a partir do século XVI, representada com grande dramatismo, com Cristo atado a uma coluna e ladeada dos verdugos. Quando a cena se encontra despida de todo e qualquer elemento (verdugos, açoites) transforma-se numa imagem de grande devoção, como é o caso deste exemplar do noviciado da Cotovia. A coluna à qual Jesus geralmente aparece amarrado, e a corda, o flagelo, são elementos tipo que aparecem na Arma Christ. Com estas imagens os escultores praticavam a criação do nu, proibido pela igreja pois era considerado indecoroso e desonesto
10. PARAMENTARIA
Na paramentaria impera o princípio do culti decori, onde a sacralidade da função está associada à riqueza dos materiais. Servem para glorificar a Deus de maneira mais nobre e eficaz.
A função dos paramentos, ricamente bordados, é decorativa mas também serve «…de reforço do mecanismo de atracão dos sentidos dos crentes.»
Concílio de Trento, Sessão XXII refere-se ao aparato na celebração da missa da seguinte maneira:
aquele que «…disser que as cerimónias, vestimentas, e sinais externos que usa a Igreja Católica na celebração das Missas, são muito mais incentivos de impiedade que obséquios piedosos, seja excomungado» (Cân. VII).
Para a igreja católica, as vestes representam Cristo cheio de glória.
Importam-se as novas tendências do Oriente exótico. Chegam a Lisboa, – a cidade europeia mais cosmopolita – como produto exótico, muito atrativo e a baixo custo, devido à utilização de mão-de-obra barata.
No Frontal de altar da igreja do noviciado da Cotovia vamos encontrar símbolos chineses: no campo central uma águia bicéfala; nas laterais, um vaso bojudo com crisântemos e peónias; é ladeado por um dragão e por um leão a brincar com a bola de brocado. No centro da barra, inscreve-se, em cartela circular com resplendor raiado, a inscrição IHS, emblema dos jesuítas.
O Véu de cálice, é em seda creme de origem chinesa, tem um estampado com imagens de crisântemos e galhos de frutos. Ao centro, inscreve-se, em cartela circular com raios setiformes, lisos e em serpentina, alternantes, a inscrição IHS.
11. MISSAL
Inseridos no espólio do noviciado da Cotovia encontram-se três Missais dos séculos XVII e XVIII d.C..
O missal Romano contém as leituras da Missa
Pio V em 1570, através da bula Quo primum tempore, definiu o novo Missal Romano com o fim de eliminar os abusos cometidos na celebração da missa.
«…de tal sorte que os padres saibam de que preces devem servir-se e quais os ritos, quais as cerimonias, que devem observar doravante na celebração das Missas»
Lê-se: as missas de acordo com o tempo litúrgico (Advento, Natal, Quaresma, Tríduo Pascal, Tempo Pascal e Tempo Comum); O Rito da Missa (Ritos Iniciais, Liturgia da Palavra, Liturgia Eucarística (ofertório e prefácios), o Rito da Comunhão e os Ritos Finais); Apêndice do Rito da Missa (Bênçãos Solenes e Orações sobre o povo.
Este missal é da Primeira metade do séc. XVIII d.C. (1732). A capa é centrada pela imagem de Santo Inácio segurando com as mãos o livro da “Regra” da Companhia em que está inscrita a divisa AD MAIO DEI GLO REG SOC IESV, encimado por uma coroa e anjo, tudo em prata. Na contracapa a ornamentação é idêntica mas tendo ao centro a imagem de S. Francisco Xavier com lírios, atributo alusivo à pureza.
Várias gravuras a buril ornamentam o texto: a Adoração do Santíssimo, a Anunciação, o Nascimento do Menino Jesus, o Calvário e a Ressurreição
12. RELICÁRIO
Da igreja do Noviciado da Cotovia chegou-nos este relicário em prata que é testemunho da veneração que se prestava aos Santos e aos Mártires
A exposição das relíquias dos santos era, nesta época pós-tridentina, um poderoso meio de propaganda religiosa.
Santo Inácio de Loyola, afirmava que se devia venerar as relíquias, tendo a mesma fé e devoção que perante as imagens dos santos.
Nos Exercícios Espirituais, Santo Inácio de Loyola escreve:
«Louvar as relíquias dos Santos, venerando-a estas e rezando a eles.»
O Concílio de Trento na sessão XXV referiu-se às relíquias da seguinte maneira:
«Ordena o Santo Concílio a todos os Bispos e demais pessoas que tenham o encargo ou obrigação de ensinar… sobre a intercessão e invocação dos santos, honra das relíquias e uso legítimo das imagens…».
«… também os condena a Igreja, aos que afirmam que não se deve honrar nem venerar as relíquias dos santos, ou que é vã a veneração que estas relíquias e outros monumentos sagrados recebem dos fiéis…»
Era importante transmitir ao povo crente que o culto das relíquias servia de veículo para estes alcançarem a Salvação.
Quase todas as casas da Companhia de Jesus receberam relíquias vindas de Roma e da Alemanha. A igreja de S. Roque, em Lisboa, é um bom exemplo da atitude da Companhia face às relíquias.
Eram frequentemente escolhidos para adornar os altares pois exerciam um poder enigmático sobre o crente.
Este relicário é de origem italiana com as marcas da Contrastaria de Roma (chaves cruzadas e umbela) e a do ourives: leão rampante (esta marca apresenta-se defeituosa, dificultando a sua leitura e justifica a interrogação da autoria).
Relicário em forma de custódia, realizado com folha de prata aplicada sobre estrutura de madeira e assente sobre base de madeira dourada, de secção triangular, mistilínea e moldurada, com relíquias correspondentes aos dois irmãos coadjutores João Soan (de Goto) e Diogo Kisai, martirizados em Nagasaki a 5 de Fevereiro de 1597; canonizados apenas em 8 de Junho de 1862 por Pio IX mas já anteriormente venerados no contexto da Companhia de Jesus.
Concluindo,
[19, 20 e 21 novembro 2014
I SEMINÁRIO DE HISTÓRIA DE COLECÇÕES
Investigação recente e novos olhares
– Da Cotovia ao Museu Nacional de História Natural e da Ciência –
21 DE NOVEMBRO 2014 │DIA 3
Sexta –feira
Anfiteatro Manuel Valadares
5ª SESSÃO │HISTÓRIA DE COLECÇÕES: ARTE, CIÊNCIA E LIVROS
9h30 │O espólio do noviciado da Cotovia: A obra de arte total como programa cultual e de doutrinação
DAUMIER, Honoré – Kssssse! Pédro – Ksssse! Ksssse! Miguel! [ Visual gráfico]. [Paris]: chez Aubert galerie, [1833]. Litografia satírica para o jornal La Caricature, publicada a 11 de julho de 1833.
Resumo
Na Europa de 1830, devido à propagação do liberalismo e nacionalismo como ideologias, renovam-se os conceitos de liberdade e de revolução. Em Portugal, pelo decreto de 28 de Maio de 1834 D. Pedro IV extingue todas as Ordens religiosas masculinas. As Congregações religiosas foram o alvo principal da atuação dos liberais, começando por expulsar novamente os jesuítas que, organizados segundo o estatuto canónico de Missão Portuguesa da Companhia de Jesus, eram considerados “o braço armado” do Papa.
Mas, em 1828 as condições políticas internacionais e nacionais eram diferentes. Na defesa da união entre a monarquia absoluta e a instituição eclesiástica surgia a figura de D. Miguel que, tendo como retaguarda a bandeira da Santa Aliança, vai reforçar a união entre o Trono e o Altar usando os eclesiásticos para fortalecer a sua causa partidária. Foi nesse sentido que em 1829 se deu o regresso da Companhia de Jesus a Portugal, Ordem ligada ao ideário tradicionalista.
A RESTAURAR A ORDEM ABSOLUTISTA
D. Miguel I, rei de Portugal entre 1828 e 1834, morre no exílio, em Bronnbach (Alemanha), no ano 1866.
A 5 de Abril de 1967 chegam a Lisboa em aviões da Força Aérea Portuguesa, os restos mortais do Rei D. Miguel I e sua esposa, a Rainha Adelaide Sofia. Já no final da tarde desse mesmo dia, os despojos reais foram acolhidos em São Vicente de Fora, no Panteão da Dinastia de Bragança.
Após a leitura do Evangelho, subiu ao púlpito o Padre jesuíta Domingos Maurício, que prestou uma sentida homenagem à memória de D. Miguel:
“No desterro imposto pelas contingências políticas obscureceu-se a lembrança das vossas benemerências nacionais… Surgiu, enfim, o momento redentor, a hora da reparação sincera, que vos reintegra no lugar que vos compete na tessitura histórica de Portugal”[1].
Contextualizando este período histórico, começamos pelo fim da época napoleónica que provocou mudanças políticas e económicas em toda a Europa levando os países vencedores (Áustria, Rússia, Prússia e Inglaterra) a sentiram necessidade de selarem um tratado para restabelecer a paz e a estabilidade política na Europa.
Assim, no Congresso de Viena (setembro 1814 – junho 1815) restabeleceu-se a paz e a estabilidade política na Europa, reorganizando as fronteiras europeias, alteradas pelas conquistas de Napoleão e restaurou-se a ordem absolutista do Antigo Regime. Com o Tratado da Santa Aliança (26 setembro 1815), garantia-se a realização prática das medidas que foram aprovadas pelo Congresso de Viena, bem como a intenção de bloquear o avanço nas áreas sob sua influência das ideias liberais e constitucionalistas, que se fortaleceram com a Revolução Francesa e que haviam desestabilizado toda a Europa. Pretendiam propagar os princípios da Fé cristã e manter o absolutismo como filosofia do Estado e sistema político dominante na Europa.
Personalidades do Congresso de Viena, gravura de Jean-Baptiste Isabey, 1819, Viena. Coleção do Banco de Portugal.
Relativamente à Santa Sé, após a derrota de Napoleão (1814), o papa Pio VII retornou a Roma. Em 1815, o Congresso de Viena devolveu-lhe quase todos os Estados Pontifícios e reconheceu aos Núncios Apostólicos o direito de precedência em relação aos demais embaixadores. Estabilizado no poder em Roma, Pio VII procurou adaptar o papado às condições políticas, intelectuais e sociais do mundo moderno, destacando-se a promoção de uma política de amizade com as nações europeias, o reconhecimento dos movimentos pela independência das colónias latino-americanos, e para apoiar a Igreja Pio VII restaura a Companhia de Jesus no mundo convencido de que ela tinha sua missão a cumprir no século XIX.
Deste modo, a Companhia de Jesus que nasceu num período histórico europeu, o Renascimento, renasce agora num outro período histórico, o das revoluções democráticas e industriais do século XIX, o do triunfo das luzes e da emergência da racionalidade científica.
Não cabe aqui desenvolver estes temas, interessando apenas sublinhar em jeito de resumo, que a doutrina contrarrevolucionária aparece em Portugal logo após a revolução de 1820 e da assinatura por parte de D. João VI de uma Constituição, limitando o papel do rei e colocando o poder no governo e num parlamento.
Assim sendo, depois de 1820 a oposição absolutista cresceu, desencadeando no país três movimentos que se destacaram de entre outros tantos: a Martinhada, a Vila-Francada e a Abrilada.
O dia 11 de novembro de 1820 (dia de S. Martinho) representou a separação das fações sociais e políticas que apareceram juntas na revolta de 1820 devido à conjuntura política. O golpe teve relevo pelo fato de pretenderem ambas as fações a imediata adoção da Constituição de Cádis. Todos eles empenhados em controlar o poder nascido da revolução. Mas um contragolpe vitorioso repõe os liberais no poder, forçando ao desterro alguns conservadores e absolutistas.
A Martinhada, momento decisivo no processo revolucionário, Lisboa, Novembro de 1820. In Exposição inconográfica, Imagens da Revolução de 1820, em colaboração com a Biblioteca Nacional de Portugal, Lisboa, Biblioteca Nacional de Portugal, Janeiro de 2021.
Na defesa da união entre a Monarquia absoluta e a instituição eclesiástica e tendo como retaguarda a bandeira da Santa Aliança, surge D. Miguel que, com o apoio de sua mãe, tem como ambição o reforço e a união entre o Trono e o Altar. Um conjunto de acontecimentos animaram o partido da rainha a revoltar-se abertamente, confiante no auxílio francês.
A 27 de Maio de 1823, o Infante D. Miguel deslocou-se a Vila Franca. Aí foram dados vivas à monarquia absoluta, conjeturando o infante e a rainha a possível abdicação de D. João VI, que se mantinha fiel à Constituição que jurara.
No discurso D. Miguel apela ao apoio à sua causa baseada na união entre Monarquia, Nobreza, Tradicionalismo e Deus, pilares sagrados que permitiam a elevação para uma sociedade equilibrada e ordenada segundo princípios divinos.
Vilafrancada – insurreição liderada pelo Infante D. Miguel de Portugal em Vila Franca de Xira a 27 de maio de 1823. Dom Miguel, [Lisboa, na Impressão de Alcobia, 1823], gravura, BNP.
Porém, D. João VI decidiu tomar a direção da revolta, encorajado pelo levantamento do Regimento de Infantaria 18, que viera ao Palácio da Bemposta dar-lhe vivas como rei absoluto; partindo para Vila Franca, obrigou o infante a submeter-se-lhe e regressou a Lisboa em triunfo. As cortes dispersaram-se, vários políticos liberais partiram para o exílio e foi restaurado o regime absolutista, mas D. João VI conseguiu impedir a ascensão ao poder do partido ultrarreacionário e manteve a sua posição determinante no quadro político. O partido da rainha não deixou, porém, de continuar a intrigar, e menos de um ano mais tarde eclodia nova revolta absolutista, a Abrilada (Abril de 1824), dando origem ao exílio do próprio filho, o Infante D. Miguel[2].
D. João VI dirige-se aos portugueses através de uma proclamação em que descreve cronologicamente todos os acontecimentos, publicada no Suplemento ao nº 110 da Gazeta de Lisboa, 10 de maio de 1824, edição de 2ª feira:
«Proclamação de S. M.
Portuguezes! O vosso Rei não vos abandona, pelo contrário só quer libertar-vos do terror, da ansiedade que vos oprime, restabelecer a segurança publica, e remover o véo que vos encobre ainda a verdade; na certeza de que á sua voz toda esta Nação leal se unirá para sustentar o Trono (…)
Meu filho, o Infante D. Miguel, que há tão pouco tempo ainda se cobrira de gloria pela acção heróica que emprehendeo, he o mesmo que impelido agora por sinistras inspirações, e enganado por conselhos traidores, se abalançou a cometer actos, que, ainda quando fossem justos e necessários, só devião emanar da minha Soberana Authoridade, atentando assim contra o Poder Real (…)
Bordo da Náo Ingleza Windsor Castle, surta no Téjo, em nove de Maio de 1824.
ELREI Com Guarda». In Hemeroteca Municipal de Lisboa.
Todos estes acontecimentos prenunciavam uma Guerra Civil (1828-1834) ou a Guerra dos Dois Irmãos.
Dia 30 de setembro 1833 D. Pedro, Duque de Bragança, assume a regência do reino de Portugal durante a menoridade de D. Maria II.
[2] MARQUES, Teresa Martins, Uma carta inédita de Dona Carlota Joaquina, Navegações, vol. 2, nº 1 (jan./jun. 2009), pp. 53-56.
Veja-se o artigo completo:
VEIGA, Francisca Branco, “O BREVE REGRESSO DA COMPANHIA DE JESUS NO REINADO DE D. MIGUEL (1829-1834)”. In Brotéria, vol. 179, (5/6 de nov./dez. 2014), pp. 387-400.
D. Miguel and the Jesuits: mutual fidelity to ancient traditions 1829-1834
RESUMO:
Este artigo tem como objetivo procurar responder a questões relativas à segunda entrada da Companhia de Jesus em Portugal, concretamente o contexto externo e interno que lhe deu origem, os propósitos que serviu e as razões que determinaram a segunda expulsão.
A autora baseou a sua análise em fontes históricas documentais inéditas e secundárias, destacando-se entre as fontes primárias um repositório de documentos do espólio documental do Arquivo da Província Portuguesa da Companhia de Jesus.
Foi seguida uma metodologia cronológico-evolutiva na reconstrução do período histórico em análise, seguindo os estudos de historiadores de relevo para a história política e religiosa miguelista.
Como representante do tradicionalismo e conservadorismo, a Companhia de Jesus constitui-se como um instrumento fundamental na afirmação dos ideais miguelistas e reforço da sua causa, mas jesuítas e miguelistas tinham o destino da sua presença traçado perante os ideais do liberalismo.
This article aims to provide answers to some questions related to the second entry of the Society of Jesus in Portugal, specifically the external and internal context that gave rise to it, the purposes it served, and the reasons that determined the second expulsion.
The author based her analysis on unpublished and secondary historical documentary sources, highlighting among the primary sources a repository of documents from the documentary collection of the Archive of the Portuguese Province of Society of Jesus.
A chronological-evolutionary methodology was followed in the reconstruction of the historical period under analysis, following the studies of relevant historians regarding the miguelist political and religious history.
As a representative of traditionalism and conservatism, the Society of Jesus constitutes itself as a fundamental instrument in the affirmation of the miguelist ideals and reinforcement of its cause, but Jesuits and miguelists had the destiny of their presence traced before the ideals of liberalism.
Keywords: miguelism / jesuits / liberalism
INTRODUÇÃO
Em 1759 os jesuítas foram expulsos de todos os territórios portugueses e pelo breve papal Dominus ac Redemptor (21 de julho de 1773), o Papa Clemente XIV suprimia a Companhia de Jesus no mundo.
A sua expulsão de Portugal fazia parte de um projeto político iluminista e centralizador para o qual a Companhia de Jesus era considerada um obstáculo. Na literatura sobre a temática dos Jesuítas portugueses exilados pelo marquês de Pombal prevalece o estudo recente de António Trigueiros, afirmando este que, “No horizonte da política regalista de Carvalho e Melo estaria a total subordinação da Igreja ao poder do Estado e a simpatia pela criação de uma Igreja nacional” (TRIGUEIROS 2016:13).
A literatura sobre o pensamento europeu moderno faz referência a acontecimentos como a Revolução Francesa (1789) ou a dissolução do Sacro Império Romano-Germânico (1806), e a consequente ascensão do nacionalismo, como indicadores relevantes de que estava a nascer uma nova «orgânica» política e social na Europa (BAUMER 1977: 13). As explicações metafísicas do mundo já não se coadunavam com o mundo da experiência e com a consciência crescente do condicionalismo histórico do respetivo momento (BAUMER 1977; HOBSBAWM 001; RÉMOND 1994).
Contudo, após as Guerras Napoleónicas, ea consequente derrota de Napoleão na Batalha de Waterloo, as monarquias conservadoras depostas/exiladas voltam a subir ao trono, pretendendo-se o restabelecimento do princípio da legitimidade monárquica. O programa de uma Santa Aliança como mecanismo regulador terá então como objetivo a contenção de novos focos revolucionários.
Neste contexto, em 1814 «O mundo católico exige com unanimidade o restabelecimento da Companhia de Jesus». Assim sustentava o Papa Pio VII, por meio da Bula Pontifícia Sollicitudo omnium Ecclesiarum, lida no dia 7 de agosto de 1814 na Igreja de Gesù, restabelecendo a Companhia no mundo. Não obstante, para muitos historiadores, como por exemplo Eric Hobsbawm, «a tendência geral, entre 1789 e 1848, foi a de uma acentuada secularização» da sociedade (HOBSBAWM 2001: 225).
Assim, em Portugal, na primeira metade do século XIX, a sociedade foi atravessada por uma série de acontecimentos – invasões francesas, domínio inglês, a revolução de 1820, a guerra civil – que despertaram, nas palavras de M. de Lourdes Lima dos Santos, uma nova intelligentsia cuja ideologia contribuiu para criar uma crise orgânica com a intelligentsia tradicional, cimentando novos discursos (SANTOS 1979: 69-115). Do lado dos governantes portugueses continuava a pesar, como refere Acácio Casimiro, uma «atmosfera de ódios e calúnias adensada por Pombal e não dissipada por seus sucessores» (CASIMIRO 1940: 475). Após um estudo exploratório do Diario das Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação Portugueza concluiu-se que maioria dos parlamentares desde a revolução de 1820 reassumiu os princípios regalistas estabelecidos no século XVIII por especialistas como António Pereira de Figueiredo, Seabra da Silva ou Ribeiro dos Santos, que defendiam a supremacia do poder civil sobre o eclesiástico, legitimando, deste modo, a política pombalina de dominação do Estado sobre a Igreja. Deste estudo concluiu-se, inclusive, que a propaganda negativa levada a cabo contra a Ordem dos Jesuítas continuava a ter um espaço de riquíssimo debate onde era impossível vingarem as ideias dos políticos mais conservadores, e muito menos a do regresso da Companhia de Jesus.
Neste contexto, os jesuítas eram acusados e combatidos pelos movimentos antijesuíticos, pela sua colagem aos modelos políticos e sociais do passado e pela sua luta contra a modernidade das ideias. D. João VI alegava que a memória histórica da Companhia de Jesus encontrava-se ainda muito manchada. Teófilo Braga refere-se a este assunto alegando que: “Quando D. João VI estava ainda no Brasil tentou-se trazel-o á coligação monarchica que começava pelo restabelecimento dos Jesuítas; os políticos que o rodeavam não comprehenderam o jogo…” (BRAGA 1902:83). Embora ele e a rainha-mãe D. Maria I não fossem desafetos da Companhia, encontravam-se rodeados por um conjunto de pessoas que não sendo liberais mantinham os ideais pró-pombalinos, como Fernando José de Portugal e Castro, Marquês de Aguiar, António de Araújo, conde da Barca, e o conde de Linhares Dom Rodrigo de Sousa Coutinho, que pretendiam manter em vigor o alvará de 3 de setembro de 1759. Em 1832, no periódico A Contra-Mina, Fortunato de S. Boaventura referia as calúnias a que estavam sujeitos os jesuítas no reinado de D. Maria I:
Nem a saudosissima, e piedosissima Rainha D. Maria I, que tomava a peito o restabelecimento dos Jesuitas em Portugal, porque tomava a peito a verdadeira, felicidade dos seus Povos, conseguio trazer novamente a este Reino, e suas Conquistas os Filhos de Sancto Ignacio! Vio-se necessitada a conter, ou reprimir os seus votos, e a deixa-los como abafados, e sepultados em seu Regio Coração …. Tanta era a força das prevenções, ou das calumnias, que ardilosamente se havião espalhado neste Reino contra os Jesuitas! (A CONTRA MINA 1832)
A rainha pretendia readmitir em Portugal os jesuítas expulsos, mas os seus conselheiros fizeram-lhe ver que tinha sido a própria Cúria Romana a extinguir essa Ordem, e que esse pedido tinha vindo de várias potências europeias, para além de que a readmissão dos jesuítas em Portugal seria um motivo de censura por parte do governo de Espanha e de França (DICIONÁRIO HISTÓRICO 1908: 817-819).
Tendo em conta a atuação política, social, educacional e religiosa da Companhia de Jesus no período até à sua extinção em 1759, pretenderam os absolutistas/miguelistas, para revigorar a Igreja, o seu restabelecimento em Portugal. O seu renascimento torna-se inteligível no quadro histórico-político e doutrinário da contrarrevolução europeia, após o Congresso de Viena. Este movimento religioso restaurador assegurava o suporte do seu sistema político na luta contra a avalanche revolucionária iniciada na França dos iluminados e pedreiros-livres.
Depois de fazer um levantamento bibliográfico do tema sentimos ser pertinente efetuar uma nova recolha de informação, mais atualizada e com uma nova perspetiva de análise que o tema merece, não realizada até hoje, tendo como enfoque principal a visão interna da Companhia de Jesus.
Esta visão interna da Companhia sobre o contexto político e social no período em análise permitiria validar as teses sobre o anti jesuitismo dominante na sociedade portuguesa, bem como sobre a manutenção dos seus ideais fortemente associados ao conservadorismo e ao absolutismo.
Podendo delimitar o estudo do objeto de análise do presente artigo, no contexto europeu, no período entre o Congresso de Viena, em 1814, e os movimentos revolucionários da década de 1830, o caso em concreto do corpus deste artigo foca-se no período histórico entre 1829 e 1834, ascensão e queda de um regime tradicionalista.
Como orientação na organização da nossa análise, optámos por uma metodologia cronológico-evolutiva, baseada numa abordagem interpretativa e demonstrativa do processo histórico antecedente e da causalidade desse processo na construção do período histórico-cronológico em análise.
Relativamente à escolha das fontes documentais a utilizar, seguimos uma via múltipla, a leitura e análise relativa à história da Europa e da Igreja Católica na época Moderna e Contemporânea, e o espólio documental que se encontra no arquivo da Província Portuguesa da Companhia de Jesus, instrumento fundamental para o objetivo do nosso trabalho, nunca antes explorado.
Assim sendo, para Portugal beneficiamos de um ambiente fecundo, onde historiadores de relevo aprofundaram a história política e religiosa. De Luís Reis Torgal e Isabel Nobre Vargues lemos um estudo sobre a revolução e contrarrevolução na sua passagem do vintismo até ao absolutismo (TORGAL; VARGUES 1993: 65-87), e de Luís Reis Torgal o estudo sobre o Tradicionalismo Absolutista e Contrarrevolucionário e o Movimento Católico (TORGAL 1993: 227-239). De Maria Alexandre Lousada procurámos descobrir o discurso político do miguelismo (LOUSADA 1987), tal como foi importante ler as diversas publicações de Armando Malheiro da Silva, historiador do miguelismo (SILVA 1993). Com Vítor Neto estudámos a relação entre o Estado e a Igreja neste contexto de mudança (NETO 1993: 265-283). D. Manuel Clemente publicou um conjunto de artigos sobre a Igreja e a sociedade portuguesa que se tornaram relevantes para a temática em questão (CLEMENTE 2012). António Matos Ferreira foi um investigador incontornável para o estudo da desarticulação do Antigo Regime e da Guerra Civil (FERREIRA 2002: 21-35). Na defesa do pensamento contrarrevolucionário em Portugal no século XIX, Fernando Campos, que organizou o inventário do pensamento contrarrevolucionário português, relembra-nos os autores que “…à refutação dos sofismos revolucionários dedicaram o melhor esforço da sua inteligência” (CAMPOS 1931-32).
O estudo sobre os jesuítas, desde o seu nascimento como Ordem religiosa até à atualidade, e em particular o fenómeno anti jesuíta estudado por José Eduardo Franco foi uma contribuição importante para a História e Antropologia religiosas da Europa Moderna e Contemporânea e em particular da História da Companhia de Jesus.
Para suportar todo o processo de investigação, tivemos a oportunidade única de trazer à luz do dia um espólio documental que se encontra no arquivo da Província Portuguesa da Companhia de Jesus em Portugal, e que consideramos ter sido um recurso de enorme relevo para a nossa pesquisa, no contexto da sua primeira utilização para pesquisa histórica.
Adicionalmente, o estudo de documentos inéditos como uma pequena obra elaborada por ex missionários jesuítas em 1834 que se encontra na biblioteca da revista Brotéria, desperta o interesse para este período de seis anos, período de profundas transformações no campo político, social e das mentalidades.
Também na coleção privada da família Conefrey encontra-se um copiador, no qual se destaca um Requerimento escrito pelos habitantes de Coimbra (de ambas as fações políticas) ao governo do regente D. Pedro, dando conhecimento do não envolvimento dos missionários Jesuítas na política do país.
Destaca-se, inclusive, nos Reservados da Biblioteca Nacional de Portugal, um espólio documental relativo à correspondência trocada entre António Ribeiro Saraiva e diversas personalidades, como por exemplo, a Princesa da Beira, D. Maria Teresa, o Padre Provincial francês Godinot e o Duque de Cadaval, relativas ao assunto dos jesuítas em Portugal, revelando estes o interesse e preocupação das principais figuras do reino para com estes “homens de Deus”. Espólio composto por centenas de caixas e já estudado em parte por Maria Teresa Mónica.
Como resultado deste estudo, acreditamos ter cumprido o objetivo de evidenciar o alinhamento de D. Miguel e dos jesuítas no que respeita à fidelidade mútua às antigas tradições, e contribuir para a identificação de novas áreas de pesquisa no âmbito da temática em apreço.
(…)
Artigo completo em:
VEIGA, Francisca Branco, “D. Miguel e os jesuítas: fidelidade mútua às antigas tradições 1829-1834” . In Revista de História da Sociedade e da Cultura, vol. 21 (2021), pp. 217-240.
Noviciado da Cotovia – Fachada, 1863 (Archivo Pittoresco, 1863)
Resumo
Este artigo sobre o noviciado da Cotovia da Companhia de Jesus, instituição criada no espaço onde atualmente existe o Museu Nacional de História Natural e da Ciência (MNHNC), tem como objetivo dar a conhecer a história e edificação deste espaço de educação e religião, no período entre 1619 e 1759.
Pelo estudo do espólio arquitetónico e artístico que chegou aos nossos dias e de fontes de informação com ele relacionado pretendeu-se demonstrar que combinando os fatores espirituais com os factores físicos, este espaço assumiu a sua forma exaltando-se o espírito do lugar de acordo com o modo nostro.
Assim, concebido para responder ao programa arquitetónico específico desta Ordem, o noviciado da Cotovia tornou-se uma referência como primeiro noviciado da Companhia de Jesus na Província Portuguesa.
Palavras-chave: Companhia de Jesus – Noviciado – Arquitetura – História
Abstract
This article about the novitiate of the Cotovia da Companhia de Jesus, an institution created in the space where the National Museum of Natural History and Science (NMNHS) currently exists, has the objective of reviewing the history and construction of this education and religion space, in the period between 1619 and 1759.
By studying the architectural and artistic heritage that has come to our days and the sources of information related to it, it was intended to demonstrate that combining spiritual with physical factors, this space built its shape, exalting the spirit of the place according to the modo nostro.
Thus, conceived to respond to the specific architectural program of this Order, the Cotovia novitiate became a reference as the first novitiate of the Society of Jesus in the Portuguese Province.
Keywords: Society of Jesus – Novitiate – Architecture – History
Introdução
Partindo do título deste artigo Segundo o modo nostro: o edifício do noviciado da Cotovia da Companhia de Jesus, 1619 – 1759 é nosso propósito fazer um estudo sobre a arquitetura do edifício dos atuais Museus da Politécnica (MNHNC), no período de 1619 a 1759, isto é, desde o início do noviciado jesuíta até à expulsão da Companhia de Jesus de Portugal.
Depois de fazer um estudo do espólio que chegou até nós e que se encontra nos reservados do Museu Nacional de História Natural e da Ciência, sentiu-se ser pertinente efetuar uma recolha de informação documental, com uma perspetiva de análise nunca realizada até hoje.
Como orientação desta análise, optou-se por uma metodologia de organização documental, baseada numa abordagem histórica e interpretativa do programa arquitetónico específico da Companhia de Jesus. Desta forma, iremos focar-nos, principalmente, em dois temas: a histórica do edifício nos 140 anos da existência do noviciado e a arquitetura dos seus espaços, inserindo-os no pós Concílio de Trento e nas instruções da Companhia de Jesus para a criação de edifícios jesuítas.
A arquitetura do edifício pensada pelo arquiteto Baltasar Alvares segue a linha do modo nostro jesuíta, onde a atenção ao método, materiais e coerência funcional tinha como fim último a criação de dois espaços distintos, a área da ação do espírito e a área das atividades do corpo e da comunidade.
Os documentos mais importantes para este estudo são as Constituições da Companhia de Jesus, os decretos e os diversos diplomas emanados do Concílio de Trento, as Instrução de S. Carlos Borromeu e os Exercícios Espirituais. Do Arquivo Nacional da Torre do Tombo recolhemos da Colecção do Colégio dos Nobres o Livro 154, da Biblioteca Nacional de Portugal o códice 145, e da biblioteca dos Museu Nacional de História Natural e da Ciência o livro do jesuíta António Franco A imagem da Virtude … em Lisboa. Todos os documentos contêm informação sobre a história do noviciado da Cotovia. Destaca-se o manuscrito do ANTT sobre a História da Fundaçam aumento e progresso da casa de provaçam da Companhia de Iesu de Lisboa, Anno de 1597, pelo facto de nunca ter sido transcrito e de conter informação precisa, escrita por contemporâneos, desde a escritura da Quinta da Cotovia até à entrada dos noviços.
Objetivamente, optou-se de forma explicita por um processo de amostragem qualitativa, assumindo a parcialidade e subjetividade dos autores e intervenientes. Na decorrência deste artigo, acredita-se terem ficado claras as razões que estiveram na origem e posterior construção deste espaço único, criado para a formação de jovens que tinham como objetivo final «ir em missão».
Veja o artigo completo em
Mátria Digital, Ano X, Número X, Dezembro 2022 – Novembro 2023
Francisca M. Branco Veiga, Segundo o modo nostro: o edifício do noviciado da Cotovia da Companhia de Jesus, 1619 – 1759, pp. 285-318.
Veja-se, inclusive, VEIGA, Francisca Branco. Noviciado da Cotovia: O Passado dos Museus da Politécnica 1619-1759. Dissertação (Mestrado em Património Cultural) – Universidade Católica Portuguesa, Lisboa, 2009.
A capela de Santo António, no interior da igreja de São Roque, em lisboa, foi fundada por Pero Machado de Brito, ficou parcialmente destruída com o terramoto de 1755 e foi restaurada no séc. XIX. Em talha dourada, é barroca no intradorso do arco e neoclássica no pano que fecha o retábulo. Tem duas esculturas, uma de Santo António e outra de S. Miguel e pinturas alusivas à vida de Santo António, de Vieira Lusitano.
A imagem do Santo apresenta-se, iconograficamente, completa nos seus atributos tradicionais. Vestido com o hábito de franciscano, com um livro na mão sobre o qual figura o Menino Jesus, que lhe terá aparecido várias vezes, em pé, virado para o santo utilizando um movimento corporal, e na outra mão um ramo de açucenas, símbolo da sua pureza. Este tipo de representação iconográfica foi muito utilizada e divulgada pela arte barroca no período da Contra Reforma.
Santo António, hoje celebrizado e lembrado quase que exclusivamente como “santo casamenteiro”, já ocupou diversos papéis no imaginário cristão de outrora. No séc. XVII ele figurava como “Farol da Igreja”, Defensor da fé”, “Martelo dos Hereges”, “Chave de Ouro”, “Oficina de Milagres”, “Padroeiro dos Impossíveis”, “Doutor Evangélico”, “Santo dos Casos e Coisas Perdidas”.
Nascido em Lisboa, aos quinze anos entrou para um convento de Cónegos Regrantes de Santo Agostinho, e em 1220, com vinte e cinco anos, impressionado pela pregação de alguns frades que conheceu em Coimbra enquanto estudava, trocou o seu nome por António e ingressou na Ordem dos Franciscanos. Viria a falecer em Pádua, onde foi sepultado em 1231. Foi canonizado um ano após ter falecido e, até finais do séc. XV, foi apenas venerado em Pádua.
Santo António detém o recorde de canonização da Igreja Católica: foi declarado santo menos de um ano decorrido sobre a sua morte, em 30 de Maio de 1232. É o santo padroeiro das cidades de Pádua e de Lisboa. Em 1934, o Papa Pio XI proclamou-o segundo padroeiro de Portugal, a par de Nossa Senhora da Conceição. Por fim, em 16 de Janeiro de 1946, o Papa Pio XII juntou o seu nome à lista dos Doutores da Igreja Católica.[1]
Produção escultórica nacional no séc. XVII
Caracterizando genericamente a produção escultórica nacional no séc. XVII denota-se uma clara opção por outros materiais que não a pedra. Os materiais eleitos pelos escultores portugueses são a madeira e o barro.
Na escultura em madeira reconhece-se quase exclusivamente imaginária sacra de carácter devocional, obedecendo às regras impostas pela Contrarreforma, saídas do Concílio de Trento, e que vão ser seguidas pelo maneirismo português.
Grande parte destas obras denunciam: desconhecimento quanto à representação anatómica; incapacidade de representação verosímil da corporeidade e da volumetria e, consequentemente, opção por soluções de representação simplistas e convencionadas; deficiente diferenciação dos materiais representados pela concepção de múltiplas texturas à superfície escultórica; incapacidade de representação de movimento com estaticidade, rigidez das figuras e respectivos panejamentos; opções iconográficas obedecendo a regras predefinidas; utilização intensiva da componente decorativa tornando-se uma escultura vivaz na diversidade policromática e na riqueza em ouro em detrimento das qualidades morfológicas relativas à massa e à textura.
A escultura do Santo António, da Igreja de São Roque, é uma escultura do ciclo do Maneirismo, onde este é representado com equilíbrio e síntese no tratamento volumétrico, com serenidade expressiva e gestual como convinha ás regras saídas da Contra-reforma. O hábito de franciscano foi decorado com apurados elementos florais e vegetalistas, em técnica de estofagem, distribuídos homogeneamente ao longo da veste. O sebasto, que atravessa diagonalmente a figura, realçado pelo dourado igualmente decorado de pequenas flores e ramagens, bem como os pregueados resultantes da suspensão do hábito pelo braço esquerdo, conferem um ritmo particular a esta escultura. O vestuário é completado com um cordão dourado à cintura.
Esta imagem faz uso da policromia. E o que é a policromia?
É o emprego de várias cores no mesmo trabalho. POLI + CROMIA = MUITAS CORES
“É a capa, ou capas, com ou sem preparação, realizadas com diferentes técnicas pictóricas e decorativas, que cobre total ou parcialmente esculturas, elementos arquitectónicos ou ornamentais, com o fim de proporcionar a estes objectos um acabamento ou decoração.”[2]
A Policromia, nesta peça, tem como finalidade revestir o volume tridimensional, completando-o e enriquecendo-o. O estofado, uma das técnicas de policromia mais complexas e de maior durabilidade e extensão, e da qual esta peça faz uso, é uma das técnicas mais vistosas, em que as cores se sobrepõem ao ouro, imitando os tecidos de ricos louvores, como os adamascados e brocados. Este trabalho de policromia combinado com o cinzelado dos tecidos criava um efeito de grande realismo, dando alguma volumetria à peça. A carnação era a última operação a realizar neste processo da policromia, mas o seu aparelho era o primeiro a fazer-se. A pintura das zonas desnudadas, carnação, valia-se de acabamentos mates e brilhantes pois assim podiam-se obter efeitos naturalistas de transparência. O rosto é muito bem tratado onde transparece uma grande dignidade de atitudes.
A produção escultórica nacional de seiscentos é preferencialmente obra de imaginários, produtores de arte sacra com funcionalidade devocional, mais do que de escultores. Os artistas e os artesãos organizavam-se em grémios profissionais de origem medieval. Cada grémio tinha estabelecido os seus estatutos através dos quais se controlava o trabalho e a comercialização das obras. Estes grémios tinham um motivo religioso vinculante, a devoção dos seus respectivos patronos, como por exemplo, S. Lucas que é o patrono do Grémio dos pintores. Em Portugal, os pintores e douradores de imaginária originavam autenticas dinastias, pois o título passava de pais para filhos, mantendo aberta a oficina durante várias gerações. Regra geral os pintores não assinavam as suas policromias, ainda que excepcionalmente se encontrem trabalhos assinados. Muitas esculturas não sendo assinadas pelos seus escultores, pelo menos de forma visível, acabam por selo no interior das imagens, o que não é o caso do Santo António, da Igreja de São Roque.
[1] Jorge Campos Tavare, Dicionário de Santos. Lello ed., 2001.
[2]Policromia: a escultura policromada religiosa dos séculos XVII e XVIII : estudo comparativo das técnicas, alterações e conservação em Portugal, Espanha e Bélgica. Congresso Internacional Policromia, Lisboa, 2002.
Patriarcado de Lisboa
Material: madeira
Autor: desconhecido
Datação: séc. XVII
Classificação: escultura
Descrição: escultura em madeira policromada e estofada, representando Santo António de Lisboa como frade franciscano, estando o Menino Jesus ao colo.
Representação de Chineses, in Jan Huygenvan Linschoten – Itinerario, Amsterdão, 1596.
[Jan Huyghen van Linschoten, filho de um notário público em Haarlem, emigrou para Sevilha e depois para Lisboa com o irmão quando tinha apenas 13 anos. Foi enviado para Goa, feitoria portuguesa na Índia, em 1583, onde procedeu à cópia ilícita de mapas náuticos portugueses. De volta à Holanda em 1595, Linschoten escreveu três livros relatando o seu conhecimento do “Oriente”. Esta imagem encontra-se inserida na sua terceira publicação Itinerario: Voyage ofte schipvaert van Jan Huyghen van Linschoten naer Oost ofte Portugaels Indien, 1579-1592, publicada em 1596 e traduzida para o inglês e o alemão dois anos depois].
Após a viagem de Vasco da Gama à Índia chegam a Lisboa notícias sobre a China e sobre as navegações chinesas no Índico, realizadas entre 1405 e 1433.
Dom vasco da Gama, conde da Vidigueira 2º Vice Rei de 2 de setembro 1524 até á sua morte em Cochim a 24 de dezembro de 1524
D. Manuel, em 1508, envia Diogo Lopes de Sequeira a Malaca com o objectivo de recolher informações sobre a China e os chineses.
A partir de 1511, após a conquista de Malaca, são feitos os primeiros contactos e é centralizado aqui o comércio português do Índico e dos mares da China.
Em 1513, Jorge Álvares penetra nos mares da China iniciando um período de intensas relações luso-chinesas.
Em 1515, em Malaca os portugueses ouvem falar de Macau, então conhecido pelo nome de Haojing, que significa Espelho de Ostra.
A partir desta data os portugueses procuram estabelecer relações diplomáticas com a China e obter um posto de comércio permanente na zona de Cantão.
Em 1517 é enviada à China a primeira embaixada, chefiada por Tomé Pires, com o intuito de estabelecer contactos políticos e diplomáticos que permitissem o comércio português na zona.
Assim, a instalação dos portugueses em Macau, em 1557, é fruto da conjugação de três factores essenciais: das condições internas e das relações internacionais estabelecidas pela dinastia reinante, Ming; do processo de aprendizagem dos portugueses nos mares da China; e da parceria de interesses comerciais que se estabeleceram entre chineses, portugueses e japoneses.
A China da dinastia Ming procura o monopólio do comércio externo marítimo através do controle da iniciativa privada das comunidades chinesas litorais e ultramarinas.
A crise fiscal e monetária da China, no tempo do imperador Jiajing (1522-1566), e o consequente incremento da procura chinesa da prata, bem como a crescente produção da prata japonesa e a capacidade dos portugueses como intermediários, em parceria com chineses e japoneses, cria a possibilidade de Macau se tornar um entreposto, por onde passa a rota da seda, prata, porcelana, ouro e cobre.
Durante a ocupação filipina (1580-1640), o Império Português tornou-se muito fraco e desprotegido, visto que o Rei de Espanha, que era simultaneamente Rei de Portugal, não estava muito interessado em defender o Império Português. Estava mais interessado em defender e expandir o seu Império, em colonizar e controlar a América do Sul e em travar guerras com as outras potências europeias, nomeadamente a Inglaterra e a Holanda. Utilizou muitos recursos para manter estas guerras, em vez de utilizá-los para defender o nosso Império. Os inimigos de Espanha tornaram-se por consequência inimigos de Portugal. As colónias portuguesas sofreram inúmeros ataques dos ingleses, dos holandeses e dos franceses e muitas delas caíram nas mãos do inimigo.
Macau foi atacada em 1622 por 800 soldados holandeses. Eles desembarcaram na praia e avançaram com cautela para a Cidade, sofrendo pesado bombardeio de canhões da Fortaleza do Monte. A guarnição militar em Macau era pequena e muito inferior à força invasora holandesa. Após 2 dias de combate, no dia 24 de Junho, um padre jesuíta disparou um tiro de canhão e acertou com precisão, um vagão carregado de pólvora pertencente aos holandeses e foi assim que os militares de Macau derrotaram as forças invasoras. Dizem os registos portugueses que morreram algumas dezenas de portugueses e que morreram em combate ou afogados cerca de 350 holandeses. Para Macau, desprevenida, a vitória foi considerada um milagre. Após a vitória, os moradores de Macau passaram a comemorar o dia 24 de Junho, dia da vitória, como o “Dia da Cidade”. É também neste dia que se comemora o São João Baptista, o Padroeiro da Cidade. Conta a lenda que foi graças ao seu manto foram desviados os tiros dos inimigos, salvando a Cidade dos invasores holandeses.
Em 1640, em Portugal, quando a classe média e aristocracia, descontentes com o domínio espanhol e com o reinado de Filipe IV de Espanha (III de Portugal), quiseram restaurar a independência, pediram a D. João para encabeçar a causa. D. João aceitou a responsabilidade e a 1 de Dezembro deu-se o golpe contra Filipe III, sendo coroado Rei de Portugal a 15 de Dezembro de 1640.
Muitos mensageiros espalharam pelo país a notícia, levando consigo cartas para as autoridades de cada terra se encarregarem de aclamarem o novo rei. D. João IV enviou também diplomatas às principais cortes europeias com o objectivo de conseguir o reconhecimento da independência.
Na China, as notícias chegam dois anos depois. Em 30 Outubro de 1642 são enviadas cartas para Portugal, da Santa Casa da Misericórdia para dar a D. João IV os parabéns da aclamação. Também à registo de, em Agosto de 1643, uma Certidão de D. Sebastião Lobo de Sylveira Capitão Geral de Macau falando da felicidade dos Padres da companhia, aclamando D. João IV.
VASCONCELLOS, José Frazão de – A Aclamação del Rei D. João IV em Macau (Subsídios Históricos e Biográficos). Separata do N.º 53 do «Boletim da Agência Geral das Colónias. Agência Geral das Colónias, 55 páginas , 1929 (24 cm x 16,5 cm). Exemplar n.º 34 da tiragem de 125 exemplares numerados.
Macau é um espaço de pluralidade religiosa onde convivem com o cristianismo as várias expressões da religiosidade chinesa: o budismo, o daoísmo e o confucionismo.
Os missionários jesuítas chegam à Ásia em 1542. Macau vai desempenhar um papel de centro difusor do cristianismo no Oriente. É a partir de Macau que partem as missões com destino ao Japão, à China e ao sueste asiático.
O Colégio de S. Paulo é a primeira universidade europeia na China, desenvolvendo cursos de artes, teologia, chinês, latim, matemática, astronomia, física, medicina, retórica e música. A impressão surge também ligada aos jesuítas e à difusão do cristianismo na China e no Japão. Em Macau imprime-se em três línguas: chinês, latim e português.
O cristianismo tem nesta parte do mundo uma forte dimensão cultural, tendo penetrado por esta via junto das elites chinesas.
Os primeiros tempos dos jesuítas na China foram essencialmente marcados pelo estudo da língua, pela observação atenta dos hábitos religiosos e sociais, pelo esforço de integração cultural e, sobretudo, por uma grande contenção nos gestos e nas palavras, a fim de não darem azo a qualquer suspeita de confronto susceptíveis de justificarem a sua expulsão do país. Mesmo assim muitas foram as injúrias, os desacatos e intrigas contra os membros da Companhia de Jesus levando a extremos, como por exemplo, ao martírio de alguns membros.
Os 120 Mártires da China
Memorial plaque for the 120 Martyr Saints of China at Saint Francis Xavier Church (Ho Chi Minh City)
[Os 120 Mártires da China, ou Agostinho Zhao Rong e 119 Companheiros, mártires na China, são mártires católicos da China e santos da Igreja Católica canonizados no dia 1 de Outubro de 2000 pelo Papa João Paulo II]