Martinho Lutero (Eisleben, 10 de novembro de 1483 – Eisleben, 18 de fevereiro de 1546)

Durante a Renascença italiana, obras antigas inspiraram os estudiosos italianos, dando origem a diversos movimentos humanistas. Com os Iluministas, os valores humanistas foram reforçados, com os avanços da ciência e das tecnologias, acreditando-se nas capacidades do Homem (individualismo/antropocentrismo; espirito crítico; racionalismo) . 

A decadência dos costumes do alto clero secular (bispos, cardeais e papas), devido à imoralidade,
ao absentismo, à falta de vocação, à compra e venda de cargos eclesiásticos e a falta de austeridade, venda de relíquias, venda de indulgências e exploração da crença e da piedade dos fiéis pela Igreja Monástica, levou à quebra do prestígio e da autoridade da Igreja Católica Romana.

Os humanistas cristãos criticavam a hipocrisia e a corrupção do clero, defendiam a necessidade de renovação da vida religiosa, e procuravam através da crítica e do estudo dos textos evangélicos realçar o afastamento da mensagem que a Bíblia transmitia, propondo o regresso à pureza original do cristianismo e à interioridade da fé, defendendo a tradução da Bíblia para as línguas nacionais, de modo a possibilitar aos crentes um acesso direto e pessoal aos textos sagrados e colocando em causa o papel exclusivo dos sacerdotes na leitura e interpretação dos Evangelhos.

Como humanistas cristãos, apoiavam-se nos textos antigos, com o fim da purificação das Escrituras Sagradas, recusando a interpretação contida nas diversas em citações feitas pelas autoridades clericais medievais.

Martinho Lutero era um cristão profundamente devoto e, como qualquer homem do seu tempo, vivia preocupado com a questão do julgamento final e da salvação eterna.

Entendia que nem as obras nem as indulgências influenciavam a salvação dos homens e que só a fé em Deus podia salvá-los.

Para Lutero, o caminho da salvação era da responsabilidade do cristão e da sua fé; as indulgências eram, assim, contrárias à doutrina cristã.

Em 31 de Outubro de 1517, Martinho Lutero afixou na porta da catedral de Wittenberg, as 95 Teses contra as Indulgências.

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Porta da Igreja de Todos os Santos com as 95 Teses de Martinho Lutero inscritas no original em latim. (https://commons.wikimedia.org/wiki/File:95Thesen2390.JPG)

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Estava aberta a rutura com Roma e iniciava-se um novo cisma na cristandade ocidental. O ano de 1517 assumia-se como a data oficial do início da Reforma.

O protestantismo viu a sua definição concretizada, em 1530, na Confissão de Augsburgo:

Martinho Lutero recusou alguns dos dogmas católicos:

– negava a hierarquia e a autoridade do papa;

– o celibato eclesiástico foi recusado. Todos os cristãos eram iguais pelo Batismo;

– o sacerdócio era universal: todos os crentes eram pastores;

– a Bíblia foi traduzida para as línguas nacionais;

– os Evangelhos eram a única fonte de fé e de toda a revelação;

– negava o papel das obras na salvação: só a fé em Deus era salvadora;

– quanto aos sacramentos: reconhecia o Batismo e a Eucaristia; – adotou a comunhão do pão e do vinho instituída por Cristo;

– recusou o papel da Virgem e dos santos;

– não reconhecia a validade de determinados ritos;

– a missa era celebrada em língua vulgar e não em latim;

– elementos principais do culto: a leitura da Palavra do Evangelho, o sermão e os cânticos.

Foi o movimento protestante e a sua rápida expansão que deu o impulso e impôs a urgência de renovação da Igreja Católica.

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Lutero morto conforme retratado por Lucas Cranach, o Velho

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Encontra-se sepultado na Igreja do Castelo de Vitemberga (Alta Saxónia, Alemanha)

Schlosskirche (Palace Chapel) in Wittenberg

A REAÇÃO DA IGREJA CATÓLICA

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RENASCIMENTO

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VEIGA, Francisca Branco (2024),   Martinho Lutero (Eisleben, 10 de novembro de 1483 – Eisleben, 18 de fevereiro de 1546) (blogue da autora Francisca Branco Veiga). Disponível em: https://franciscabrancoveiga.com/ [29 de Fevereiro de 2024].

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Biblioteca da Ajuda, Jesuítas na Ásia, Série da Província da China, Séculos XVI e XVII

O período histórico em apreço é de tal modo importante e tão cheio de particularidades que um historiador pode bem sentir-se frustrado na escolha deste ou daquele tema. Para este trabalho, o conjunto de códices que a biblioteca da Ajuda tem sobre os jesuítas na Ásia é de uma quantidade e valor inestimável pelo que me foi difícil fazer a opção de escolha.

Após a viagem de Vasco da Gama à Índia chegam a Lisboa notícias sobre a China e sobre as navegações chinesas no Índico, realizadas entre 1405 e 1433.

D. Manuel, em 1508, envia Diogo Lopes de Sequeira a Malaca com o objectivo de recolher informações sobre a China e os chineses.

A partir de 1511, após a conquista de Malaca são feitos os primeiros contactos e é centralizado aqui o comércio português do Índico e dos mares da China.

Em 1513, Jorge Álvares penetra nos mares da China iniciando um período de intensas relações luso-chinesas.

Em 1515, em Malaca os portugueses ouvem falar de Macau, então conhecido pelo nome de Haojing, que significa Espelho de Ostra.

A partir desta data os portugueses procuram estabelecer relações diplomáticas com a China e obter um posto de comércio permanente na zona de Cantão.

Em 1517 é enviada à China a primeira embaixada, chefiada por Tomé Pires, com o intuito de estabelecer contactos políticos e diplomáticos que permitissem o comércio português na zona.

Assim, a instalação dos portugueses em Macau, em 1557, é fruto da conjugação de três factores essenciais: das condições internas e das relações internacionais estabelecidas pela dinastia reinante, Ming; do processo de aprendizagem dos portugueses nos mares da China; e da parceria de interesses comerciais que se estabeleceram entre chineses, portugueses e japoneses.

A China da dinastia Ming procura o monopólio do comércio externo marítimo através do controle da iniciativa privada das comunidades chinesas litorais e ultramarinas.

A crise fiscal e monetária da China, no tempo do imperador Jiajing  (1522-1566), e o consequente incremento da procura chinesa da prata, bem como a crescente produção da prata japonesa e a capacidade dos portugueses como intermediários, em parceria com chineses e japoneses, cria a possibilidade de Macau se tornar um entreposto, por onde passa a rota da seda, prata, porcelana, ouro e cobre.

Durante a ocupação filipina (1580-1640), o Império Português tornou-se muito fraco e desprotegido, visto que o Rei de Espanha, que era simultaneamente Rei de Portugal, não estava muito interessado em defender o Império Português. Estava mais interessado em defender e expandir o seu Império, em colonizar e controlar a América do Sul e em travar guerras com as outras potências europeias, nomeadamente a Inglaterra e a Holanda. Utilizou muitos recursos para manter estas guerras, em vez de utilizá-los para defender o nosso Império. Os inimigos de Espanha tornaram-se por consequência inimigos de Portugal. As colónias portuguesas sofreram inúmeros ataques dos ingleses, dos holandeses e dos franceses e muitas delas caíram nas mãos do inimigo.

Macau foi atacada em 1622 por 800 soldados holandeses. Eles desembarcaram na praia e avançaram com cautela para a Cidade, sofrendo pesado bombardeio de canhões da Fortaleza do Monte. A guarnição militar em Macau era pequena e muito inferior à força invasora holandesa. Após 2 dias de combate, no dia 24 de Junho, um padre jesuíta disparou um tiro de canhão e acertou com precisão, um vagão carregado de pólvora pertencente aos holandeses e foi assim que os militares de Macau derrotaram as forças invasoras. Dizem os registos portugueses que morreram algumas dezenas de portugueses e que morreram em combate ou afogados cerca de 350 holandeses. Para Macau, desprevenida, a vitória foi considerada um milagre. Após a vitória, os moradores de Macau passaram a comemorar o dia 24 de Junho, dia da vitória, como o “Dia da Cidade”. É também neste dia que se comemora o São João Baptista, o Padroeiro da Cidade. Conta a lenda que foi graças ao seu manto foram desviados os tiros dos inimigos, salvando a Cidade dos invasores holandeses.

Em 1640, em Portugal, quando a classe média e aristocracia, descontentes com o domínio espanhol e com o reinado de Filipe IV de Espanha (III de Portugal), quiseram restaurar a independência, pediram a D. João para encabeçar a causa. D. João aceitou a responsabilidade e a 1 de Dezembro deu-se o golpe contra Filipe III, sendo coroado Rei de Portugal a 15 de Dezembro de 1640.

Muitos mensageiros espalharam pelo país a notícia, levando consigo cartas para as autoridades de cada terra se encarregarem de aclamarem o novo rei. D. João IV enviou também diplomatas às principais cortes europeias com o objectivo de conseguir o reconhecimento da independência.

Na China, as notícias chegam dois anos depois. Em 30 Outubro de 1642 são enviadas cartas para Portugal, da Santa Casa da Misericórdia para dar a D. João IV os parabéns da aclamação. Também há registo de, em Agosto de 1643, uma Certidão de D. Sebastião Lobo de Sylveira Capitão Geral de Macau falando da felicidade dos Padres da companhia, aclamando D. João IV.

Macau é um espaço de pluralidade religiosa onde convivem com o cristianismo as várias expressões da religiosidade chinesa: o budismo, o daoísmo  e o confucionismo.

Os missionários jesuítas chegam à Ásia em 1542. Macau vai desempenhar um papel de centro difusor do cristianismo no Oriente. É a partir de Macau que partem as missões com destino ao Japão, à China e ao sueste asiático.

O Colégio de S. Paulo é a primeira universidade europeia na China, desenvolvendo cursos de artes, teologia, chinês, latim, matemática, astronomia, física, medicina, retórica e música. A impressão surge também ligada aos jesuítas e à difusão do cristianismo na China e no Japão. Em Macau imprime-se em três línguas: chinês, latim e português.

Fachada da Igreja de S. Paulo em Macau
Manuel da Costa
c. 1815
Litografia a preto sobre papel
Lisboa, Arquivo Histórico Ultramarino

O cristianismo tem nesta parte do mundo uma forte dimensão cultural, tendo penetrado por esta via junto das elites chinesas.

Os primeiros tempos dos jesuítas na China foram essencialmente marcados pelo estudo da língua, pela observação atenta dos hábitos religiosos e sociais, pelo esforço de integração cultural e, sobretudo, por uma grande contenção nos gestos e nas palavras, a fim de não darem azo a qualquer suspeita de confronto susceptíveis de justificarem a sua expulsão do país. Mesmo assim muitas foram as injúrias, os desacatos e intrigas contra os membros da Companhia de Jesus levando a extremos, como por exemplo, ao martírio de alguns membros.

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A Biblioteca da Ajuda detém um acervo bastante importante, instaladas em 220 estantes, compreendendo 2800 prateleiras, num total de 3700 metros de prateleiras com um total de 105 000 espécimes manuscritos e impressos, como o Cancioneiro da Ajuda, o Livro de Traças de Carpintaria ou a obra Da fabrica que falece a cidade de Lisboa, de Francisco de Holanda.

Nos códices Jesuítas na Ásia as divisões, Série da Província do Japão, Série da Província da China, Série das Missões do Tonquim, orientam-nos no estudo dos vários espaços geográficos de missionização.

A origem do núcleo dos Jesuítas na Ásia está na chegada a Macau, em 1742, do Bispo D. Frei Hilário de Santa Rosa, acompanhado de dois franciscanos e quatro jesuítas, entre eles os Padres José Montanha S. J. e José de Jesus. À sua chegada esperava-os o Irmão João Álvares para os conduzir a Macau. Encontravam-se reunidos, pela primeira vez, os principais intervenientes de uma acção que iria frutificar na organização de um “corpo” histórico de extrema importância hoje em dia, existente na Biblioteca da Ajuda, na Biblioteca Nacional de Lisboa, e na Academia Real da História, em Madrid.

Em 1745 o Irmão João Álvares e o Padre José Montanha dirigiram os trabalhos de treslado directamente para a Procuratura da Província do Japão em Lisboa, no Colégio de Santo Antão.

O conteúdo dos treslados é diversificado: desde cartas anuas e notícias das missões, incluindo a epistolografia Xavieriana; tratados e pareceres teológicos-morais sobre os ritos sínicos, toda a série de notícias e actos das controvérsias com os Vigários Apostólicos e a Sagrada Congregação da Propaganda Fide, o longo martiriológico jesuítico, bem como a sucessão dos Bispos de Macau, China e Japão e superiores das respectivas Províncias e Vice-Províncias. Inventários e cargas do barco “negro” da viagem do Japão, bens do Colégio de Macau e da Procuratura da Província do Japão, enfim, um pouco da vida civil e religiosa de Macau. Por fim, as grandes obras de Fróis, Montanha, Valignano e Cardim, entre outros.

Da pesquisa historiográfica dos 61 códices dos Jesuítas na Ásia conseguimos ter uma ideia organizada sobre a sua penetração na Ásia, o embate cultural e a estratégia de fixação, os métodos missionários utilizados, os seus desejos, as suas convicções, os seus medos.

Através de um grande esforço de aproximação, do fomento do intercâmbio científico e de uma missionação efetiva, os missionários da Companhia de Jesus desempenharam um papel importante, a partir dos finais do século XVI e, em especial, durante o século XVII, no encontro das culturas europeia e chinesa.

Bibliografia

ARAÚJO, Horácio Peixoto de, Os Jesuítas no Império da China: o primeiro século (1582-1680), Macau: Instituto Português do Oriente, 2000.

GEADA, Maria da Conceição, Índice Onomástico da Colecção dos Jesuítas na Ásia, Lisboa, Biblioteca da Ajuda, 1976.

LEÃO, Francisco G. Cunha, Jesuítas na Ásia: catálogo e guia, Macau: Instituto Cultural de Macau: Instituto Português do Património Arquitectónico: Biblioteca da Ajuda, 1998.

LOUREIRO, Rui Manuel, Fidalgos, missionários e mandarins: Portugal e a China no século XVI, Lisboa: Fundação Oriente, 2000.

PEREIRA, Galiote, Primeiros escritos portugueses sobre a China, Lisboa: Alfa, D.L. 1989.

RODRIGUES, Francisco, A aclamação de D. João IV em Macau, Lisboa: [Tip. Porto Médico], 1944.

RODRIGUES, Francisco, Jesuítas portugueses astrónomos na China: 1583-1805, Macau : Instituto Cultural, 1990.

SANDE, Duarte de, Um tratado sobre o reino da China dos padres Duarte Sande e Alessandro Valignano (Macau, 1590) / introd., versão port. e notas de Rui Manuel Loureiro, Macau : Instituto Cultural, 1992.

SILVA, Armando Malheiro da, Arquivística: teoria e prática de uma ciência da informação, Porto: Afrontamento, imp. 1999.

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VEIGA, Francisca Branco (2024),  Biblioteca da Ajuda, Jesuítas na Ásia, Série da Província da China, Séculos XVI e XVII (blogue da autora Francisca Branco Veiga). Disponível em: https://franciscabrancoveiga.com/ [03 de Fevereiro de 2024].

(Trabalho elaborado para a cadeira de Arquivística. Mestrado em Património Histórico de Matriz Cristã. Área de Comunicação Social. Universidade Católica de Lisboa. Lisboa, 2006.

Título do trabalho: CÓDICE 49-V-3. Série da Província da China)

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