Outono de 1910 a Companhia de Jesus foi pela terceira vez expulsa de Portugal

No dia 8 de outubro de 1910 foram novamente expulsos de Portugal os jesuítas.

Após a implementação da República em Portugal, a 5 de outubro de 1910, as ações laicistas do governo Republicano atingiram as ordens religiosas. Com os decretos do novo sistema político, os religiosos da Companhia de Jesus exilaram-se em diversos países, sobretudo na Espanha, Itália e no Brasil.

Litografia colorida, da autoria de Cândido da Silva (?) alusiva à revolução que deflagrou na noite de 3 de Outubro de 1910, em Lisboa, e que conduziu à proclamação da República Portuguesa (Nota A)
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O historiador jesuíta Francisco Rodrigues, recorda as diversas dificuldades porque passaram os seus irmãos no exercício das suas atividades:

«As leis pombalinas que ainda se mantinham de pé e a cada momento se ouviam citar para ameaço de extermínio, obrigavam-na a retrahir-se prudentemente, a viver como escondida, sem poder levantar o rosto com desassombro nem sequer declarar abertamente o seu nome. Por outro lado as antipathias nascidas de velhos preconceitos, enraizadas em tantos espíritos, que facilmente se assustavam com o espectro jesuitico, a falta de protecção oficial, antes não raro a má vontade dos governantes, de quando em quando a perseguição declarada e a continua vexação de uma imprensa adversa e desenfreada, eram obstáculos em demasia, que peava o desenvolvimento da nova Corporação e lhes atavam as mãos e tolhiam os movimentos necessários ao seu progresso. Contudo, não obstante as remoras que lhe impediam o passo, chegou pela força da sua vitalidade a dirigir uns dezoito estabelecimentos de formação, além dos multiplicadíssimos ministérios sacerdotaes que exercia no reino e missões em esfera cada dia mais vasta» (Rodrigues 1917, p. 556)[1]

Todas as atividades dos jesuítas foram interrompidas drasticamente, com a restauração das leis de Marquês do Pombal contra os Jesuítas e o decreto de 20 de maio de Joaquim António de Aguiar de 1834[2]. Estas tinham criado na sociedade portuguesa um ambiente de desconfiança e de hostilidade em relação à Igreja católica, e em particular aos jesuítas. Posteriormente, uma série de medidas deram força de lei à política de dessacralização da sociedade (Carvalho 2013).

Logo depois da proclamação da República, o Governo Provisório iniciava a publicação de uma série de decretos com força de lei, atentatória das liberdades e dos direitos da Igreja católica. 

Medidas que deram força de lei à política de dessacralização da sociedade 1910-1911
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In summa, no outono de 1910 a Companhia de Jesus foi pela terceira vez expulsa e espoliada dos seus bens em Portugal.

Jesuítas Portugueses disfarçados, em Puerto de Santa Maria (Cádis, Andaluzia) (Azevedo 1914, p. VII)


Nota A – Descrição da litografia

Da esquerda para a direita: o bombardeamento do Palácio das Necessidades; a fuga da família real, na Ericeira; a prisão dos Jesuítas para o forte de Caxias; os combates nas ruas de Lisboa; a posição da Artilharia na Rotunda; os populares entrincheirados na Rotunda.

Ao centro, uma alegoria representando a República por entre os populares que testemunharam a proclamação na Praça do Município.

Ao centro e em primeiro plano, os elementos do Governo Provisório saúdam Machado Santos, líder militar vitorioso; sob estes, um dragão, símbolo da Casa de Bragança e do exército monárquico, jaz por terra, junto com a Coroa de Portugal. 

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[1] RODRIGUES, Francisco, SJ. – A formação intellectual do jesuita : leis e factos. Porto: Livr. Magalhães e Moniz, 1917, p. 556.

[2] O diploma de 8 de outubro (cujo conteúdo se manteve no art.º 3.º da Constituição de 1911), anulava o decreto de 18 de abril de 1901 e repunha em vigor a legislação pombalina de 3 de setembro de 1759 e de 28  de agosto de 1767 sobre a expulsão dos jesuítas, e ainda a lei de 28 de maio de 1834, que extinguia as casas religiosas e todas as Ordens Regulares.

Para conhecimento geral transcreve-se pormenores do decreto referentes aos Jesuítas:

«DECRETO COM FORÇA DE LEI DE 8 DE OUTUBRO DE 1910

O Governo Provisório da República Portuguesa faz saber que em nome da República se decretou, para valer como lei, o seguinte:

Artigo 1º: Continua a vigorar como lei da República a de 3 de Setembro de 1759, promulgada sob o regime absoluto e pela qual os jesuítas foram havidos por desnaturalizados e proscritos, e se mandou que efectivamente fossem expulsos de todo o país e seus domínios «para nele mais não poderem entrar.

[…] Artigo 5º: Em consequência e de harmonia com o disposto nos artigos 1º a 3º e nos diplomas aí referidos serão expulsos do território da República todos os membros da chamada Companhia de Jesus, qualquer que seja a denominação sob que ela ou eles se disfarcem […]

Artigo 8º: Os bens das associações ou casas religiosas serão arrolados e avaliados, precedendo imposição de selos e os das casas ocupadas pelos jesuítas, tanto móveis como imóveis, serão desde logo declarados pertença do Estado. […]

Dado nos paços do Governo da República, aos 8 de Outubro de 1910. = Joaquim Teófilo Braga = António José de Almeida = Afonso Costa = António Xavier Correia Barreto = Amaro de Azevedo Gomes = Bernardino Machado.». In Diário do Governo, n.º 4/10, Série I, de 1910-10-10.

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VEIGA, Francisca Branco (2024), Outono de 1910 a Companhia de Jesus foi pela terceira vez expulsa de Portugal (blogue da autora Francisca Branco Veiga). Disponível em: https://franciscabrancoveiga.com/ [6 de Agosto de 2024].

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A expulsão dos Jesuítas em desenhos de critica política (1766/1882/1910)

1766

1766. Sebastião José de Carvalho e Melo, 1.º Marquês de Pombal (1699-1782).
Louis-Michel van Loo (1707-71) e Claude-Joseph Vernet (1714-89).
Museu da Cidade. Palácio Pimenta, Lisboa.

Descrição:

Este retrato foi encomendado por dois comerciantes abastados, Gerard Devisme, inglês, e David Purry, suíço, sendo ambos beneficiados pela política de Pombal, pretenderam louvar a vida e a obra do Marquês.
Ministro de D. José I, durante 27 anos (1750-1777), é a figura representante do Despotismo Iluminado português. Nesta pintura, a sua mão esquerda aponta para o Tejo, numa alusão direta à expulsão dos Jesuítas (vista como obstáculo às reformas, esta Ordem ordem foi expulsa do império português em 1759), ao controlo do Tribunal do Santo Ofício e à submissão da Igreja portuguesa. Vemos o Mosteiro dos Jerónimos como obra representante da reafirmação e vocação atlântica do reino português. Após o terramoto de 1755, e segundo os princípios do racionalismo iluminista , teve mão de ferro e espírito pragmático ao coordenar eficazmente a reconstrução de Lisboa, podendo visualizar-se simbolicamente esse espírito na estátua equestre de D. José, que se encontra no centro da nova “Praça do Comércio”, que substituiu o velho “Terreiro do Paço”, como também nas plantas que repousam debaixo da sua mão direita e sobre a banqueta, que se encontra à sua frente.

1882

“A Expulsão dos Jesuítas”
Litografia
Vejam Vóssorias o que eu faria se fosse o sr. marquez de Pombal …
Ass: “Raphael Bordallo Pinheiro”
Periódico O António Maria, 11.05.1882, pp. 148-149

O Zé Povinho vestido de marquês de Pombal, à imagem da pintura que se encontra acima, a fazer sair da barra de Lisboa os jesuítas. Neste desenho, o seu braço direito repousa sobre um panfleto com a indicação “Ensino Livre”. Nesse sentido, fundou a Aula do Comércio, o Real Colégio de Nobres e criou e distribuiu por todo o país 497 postos de “mestres de ler e escrever”. Reformou a Universidade de Coimbra, até aí controlada pela escolástica jesuítica.

1882 marca a data das comemorações do centenário de Marquês de Pombal. Esta data foi utilizada pela Maçonaria como símbolo do nacionalismo português e convenientemente aproveitada para uma campanha contra a Companhia de Jesus com a criação de ligas antijesuíticas por todo o País.

Em tom épico, Bordalo Pinheiro pretende mostrar como o Marquês de Pombal, ao expulsar os jesuítas, ambiciona devolver a Portugal a confiança e o progresso.

1910


Título: “A expulsão dos Jesuítas em 10 de Outubro de 1910” – bilhete postal com ilustração satírica alusiva às políticas anticlericais de Afonso Costa.

Seguindo ideologicamente o Marquês de Pombal, a postura de Afonso Costa e a composição lembram a pintura do século XVIII de Louis-Michel van Loo representando o Marquês de Pombal – traçando um paralelo entre os dois indivíduos. A alcunha de “mata-frades” dada a Afonso Costa pelos seus opositores reflete a intensidade com que este político levou a tarefa de demolir o poder da Igreja após o 5 de outubro.

No dia 8 de outubro de 1910 os Jesuítas foram novamente expulsos. O historiador jesuíta Francisco Rodrigues, recorda as diversas dificuldades porque passaram os seus irmãos no exercício das suas atividades: 

«As leis pombalinas que ainda se mantinham de pé e a cada momento se ouviam citar para ameaço de extermínio, obrigavam-na a retrahir-se prudentemente, a viver como escondida, sem poder levantar o rosto com desassombro nem sequer declarar abertamente o seu nome. Por outro lado, as antipathias nascidas de velhos preconceitos, enraizadas em tantos espíritos, que facilmente se assustavam com o espectro jesuitico, a falta de protecção oficial, antes não raro a má vontade dos governantes, de quando em quando a perseguição declarada e a continua vexação de uma imprensa adversa e desenfreada, eram obstáculos em demasia, que peava o desenvolvimento da nova Corporação e lhes atavam as mãos e tolhiam os movimentos necessários ao seu progresso. Contudo, não obstante as remoras que lhe impediam o passo, chegou pela força da sua vitalidade a dirigir uns dezoito estabelecimentos de formação, além dos multiplicadíssimos ministérios sacerdotaes que exercia no reino e missões em esfera cada dia mais vasta» (RODRIGUES 1917: 556) 

Todas as atividades dos jesuítas foram interrompidas drasticamente, com a restauração das leis pombalinas de 1759 e de Joaquim António de Aguiar de 1834. Estas tinham criado na sociedade portuguesa um ambiente de desconfiança e de hostilidade em relação à Igreja católica, e em particular aos jesuítas. Posteriormente, uma série de medidas deram força de lei à política de dessacralização da sociedade (CARVALHO 2013).
In summa, no outono de 1910 a Companhia de Jesus foi pela terceira vez expulsa e espoliada dos seus bens em Portugal.

Como referir este artigo:

Sendo um blogue com conteúdos de criação intelectual privada, estão protegidos por direitos de autor. Seja responsável na utilização e partilha dos mesmos!

VEIGA, Francisca Branco (2024), A expulsão dos Jesuítas em desenhos de critica política (1766/1882/1910)(blogue da autora Francisca Branco Veiga). Disponível em: https://franciscabrancoveiga.com/ [05 de Junho de 2024].