RETRATO DE FERNÃO TELES DE MENESES, Fundador do Noviciado da Cotovia (MNHNC)

Fernão Teles de Meneses.
@franciscabrancoveiga
Autor (es)
 Desconhecido
Datação
c. 1630-40
Proveniência
Noviciado da Cotovia
Inscrição: Maiúsculas, no canto inferior esquerdo:
FERNAN TELLES / DE MENEZES / FVNDADOR DES / TA CAZA DA PRO / VAÇAM DA COMPª / DE IHS

Pintura de aparato de Fernão Teles de Meneses, fundador do Noviciado da Cotovia, datada do século XVII (c. 1630–1640), de autoria desconhecida, possivelmente de origem espanhola. Proveniente da antiga sacristia da igreja do noviciado, encontra-se atualmente à guarda do MUHNAC.

A composição apresenta uma forte carga iconográfica associada ao período filipino, evidenciada, entre outros elementos, pela armadura filipina que enverga. Fernão Teles de Meneses empunha um bastão de comando, símbolo da sua função de Governador das Índias, enquanto a luva destacada remete para o seu cargo de Governador do Algarve. Ao peito ostenta a Cruz de Cristo, insígnia honorífica [1].

O fundo da pintura é composto por um cenário de aparato, onde se destaca uma mesa coberta com um manto ricamente bordado e um reposteiro, possivelmente em veludo, com pregas pronunciadas e pendentes decorativos. A tela parece articular os dois mundos da figura retratada: o do guerreiro e o do político.

Do ponto de vista pictórico, observa-se um certo desequilíbrio na execução: embora a generalidade da composição revele uma pintura de grande qualidade, as feições da figura central apresentam menor rigor técnico, o que poderá indicar a intervenção de mais do que um artista. A obra caracteriza-se ainda por um claro-escuro marcadamente intenso.

A moldura não é original, sendo provavelmente do século XIX. A pintura apresenta repintes e evidências de restauro em zonas da tela anteriormente rasgadas.

No canto superior esquerdo, encontra-se um escudo partido com as armas de Fernão Teles de Meneses e de sua esposa, D. Maria de Noronha: o primeiro esquartelado com leões altivos e campo liso (Teles de Meneses); o segundo com as armas do Reino, relativas à família Faro [2]

A pintura foi restaurada por Francisco Bueto (?), em 30 de junho de 1878 (AHMUL, Conta_Jul_1878_doc59).

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[1] Cruz de Cristo – História

Em todas as gravuras a imagem de Fernão Teles de Meneses exibe um medalhão da Ordem Honorífica que lhe foi atribuída e que lhe conferiu o grau de Comendador.

Origens na Ordem dos Templários

A Cruz de Cristo tem origem na Ordem dos Templários, uma ordem religioso-militar fundada no século XII com o propósito de proteger os peregrinos cristãos na Terra Santa.

Com a extinção da Ordem dos Templários pelo Papa Clemente V, em 1312, o rei D. Dinis procurou garantir a continuidade dos bens e da missão dos Templários em Portugal. Para isso, solicitou ao Papa a criação de uma nova ordem.

Criação da Ordem de Cristo (1319)

Em 1319, o Papa João XXII autorizou oficialmente a fundação da Ordem de Cristo em Portugal.

Esta nova ordem:

  • Herdou os bens e propriedades dos Templários em território português.
  • Adoptou a cruz vermelha, que viria a ser conhecida como Cruz de Cristo, como símbolo.

A Cruz de Cristo e os Descobrimentos

Durante os séculos XV e XVI, a Cruz de Cristo tornou-se um símbolo fortemente associado aos Descobrimentos Portugueses.

  • Era pintada nas velas das naus e caravelas, como as de Vasco da Gama e Pedro Álvares Cabral.
  • Representava a fé cristã, o poder da Coroa Portuguesa e a missão evangelizadora das explorações ultramarinas.

Da Ordem Religiosa à Ordem Honorífica

Com o passar do tempo, a Ordem de Cristo ficou cada vez mais subordinada à autoridade real.

  • Em 1834, com a extinção das ordens religiosas em Portugal, a ordem foi secularizada.
  • Passou a ser usada como uma ordem honorífica do Estado, concedida a quem prestasse serviços relevantes à Nação.

Ordem Militar de Cristo (actualidade)

Hoje em dia, a Ordem Militar de Cristo é uma das Ordens Honoríficas Portuguesas, atribuída pelo Presidente da República.

É conferida a cidadãos (portugueses ou estrangeiros) que se tenham distinguido por:

  • Serviços relevantes prestados ao Estado Português.
  • Mérito nas áreas da administração pública, diplomacia, ou carreira militar.

Insígnia e Graus

Existem vários graus honoríficos, como: Cavaleiro, Oficial, Comendador, Grande-Oficial, e Grã-Cruz.

O símbolo da ordem é a Cruz de Cristo – uma cruz vermelha com braços em forma de flor-de-lis.

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[2] O seu brasão apresenta-se dividido verticalmente em duas partes. No lado esquerdo, ocupando o primeiro e o quarto quartel, figura um leão rampante. No lado direito, sete torres quadradas de ouro, lavradas a negro e dispostas em 3, 2, 2, preenchem o campo. Ao centro, encontram-se cinco escudetes azuis dispostos em cruz, cada um carregado com cinco besantes de prata colocados em sautor, todos inseridos num contorno. O fundo vermelho desta secção simboliza a vitória, a fortaleza e a ousadia.

Como referir este texto:

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In VEIGA, Francisca Branco. Noviciado da Cotovia 1619-1759. Ed. Autor, 2025.

VEIGA, Francisca Branco, RETRATO DE FERNÃO TELES DE MENESES, Fundador do Noviciado da Cotovia (MNHNC) (blogue da autora Francisca Branco Veiga). Disponível em: https://franciscabrancoveiga.com/ [28 de maio de 2025].

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Fernão Teles de Meneses (governador da Índia e fundador do noviciado da Cotovia)

(I – Fernando Tellez
Retratos dos Vices Reys e Governadores da India dispostos pela ordem de seus governos collegidos nos mezes de Abril e Maio de 1791. Publicado entre 1674 e 1791.
II – Fernão Teles de Meneses, segundo a pintura do Palácio de Goa.
Tratado de todos os vice-reis e Governadores da Índia. Publicado em 1962
III – Fernão Teles de Meneses, (Galeria dos Vice-Reis) Archaeological Museum, Velha Goa, Goa.
Vice-Reis e Governadores da Índia Portuguesa. Publicado em 1999.
IV – Fernão Teles de Meneses.
MNHNC. Século XVII)

Fernão Teles de Meneses, nasceu em 1530 em Santarém, filho de Brás Teles de Meneses, alcaide-mor de Moura, camareiro-mor, guarda-mor e capitão dos ginetes e se D. Catarina de Brito. Casado com D. Maria de Noronha, filha de D. Francisco de Faro, da casa dos condes de Faro, Vedor da Fazenda dos reis D. Sebastião e D. Henrique e de D. Mécia de Albuquerque Henriques. Segundo D. António Caetano de Sousa, “…nella nomeou seu pay hum Padraõ de huma tença com licença delRey, por Provisaõ passada a 8 de Fevereiro de 1579, que está no Liv. 14. Fol.272. da sua Chancelaria.”[1] Não tiveram filhos mas Fernão Teles de Meneses teve uma filha fora do casamento,de seu nome Soror Clara do Lado, freira do mosteiro do Castelo, em Moura,[2]ao qual deixou bens depois da sua morte.[3]

Seguiu viagem para a Índia em 1566, na armada do vice-rei D. Antão de Noronha[4] e fez parte, como capitão de uma fusta[5], numa expedição dirigida por D. Antão de Noronha contra a rainha de Olala, em 1568.Em 1570 foi a pedido do Conde de Atouguia em seu auxílio para libertar Chaul do cerco dos inimigos. Serviu de maneira ilustre como capitão em Ormuz e no Malabar.

Retrato póstumo de Luís de Camões, oferecido por 
Fernão Teles de Meneses a D. Luís de Ataíde, datado de Goa, 1581[6]

Com a morte do Conde de Atouguia e aberta a primeira via de sucessão, ficou a 10 de Março de 1581 com o seu lugar de governador da Índia, tomando posse do cargo a 13 do mesmo mês. Antes da sua mudança para a Casa dos Governadores mandou colocar lá o seu retrato. A sala dos retratos que de inicio se encontrava na Casa de Sabaio, foi com Fernão Teles de Meneses transladada para uma nova casa, conhecida como “casa da fama”,[7] mandada construir por D. Luis de Ataíde, sendo completada com todos os retratos dos governadores e vice-reis seus antecessores. Tomou, nessa altura, conhecimento da posse de Filipe I no trono de Portugal. A 3 de Novembro de 1581 jurou e fez jurar o novo rei em todo o estado da Índia. Fez entrega do governo, sem ter feito qualquer alteração na administração pública, a D. Francisco de Mascarenhas, Conde de Sta Cruz, em 17 de Setembro do mesmo ano.

 Na Biblioteca Nacional encontra-se um documento relativo às armadas que partiram para a Índia onde faz a seguinte referência a Fernão Teles de Meneses: “ D. Francisco de Mascarenhas Vice-Rei e Capitão-mor partio a 4 de Abril, Capitães Pero Lopes de Sousa, Manoel de Miranda, João Menelao. E para Malaca hum Galeão de que era Capitão Leonel de Lima, que voltando para este Reino invernou em Moçambique, e não pode fazer viagem. A nao de Manoel de Miranda desapareceo á volta e elle ficou na India. Nestas naos veio o Governador Fernão Telles que succedeo ao Conde de Atouguia.”[8]

Retratos dos Vices Reys e Governadores da India dispostos pela ordem de seus governos collegidos nos mezes de Abril e Maio de 1791. – [S.L. : s.n., entre 1674 e 1791], nº 79.

Por iniciativa de Filipe I, regressa a Portugal tendo-lhe sido entregue o governo do Algarve, além do lugar de Capitão-general do mesmo território, General da armada, Conselheiro de Estado, Regedor da Casa da Suplicação e presidente do Conselho da Índia. Era Comendador de Santa Maria da Louzãa na Ordem de Cristo, e da de Moura na Ordem de Aviz.

Como Governador do Algarve (1º governador do Algarve que se seguiu aos fronteiros-mores) participou na resistência às tentativas de desembarque de Drake em Lagos.[9] Os danos causados pela artilharia inglesa a Lagos, bem como o receio de novos ataques no litoral, levaram à reconstrução das suas defesas nos anos seguintes. Em 1598, Fernão Telles de Menezes concluiu as obras na segunda cerca da muralha.

Nesta altura encontrava-se o casal a morar em Lagos quando souberam que a Companhia de Jesus procurava um local para fundar uma casa separada para os noviços, logo se propuseram a ser seus fundadores. A 18 de Setembro de 1589 foi lavrada a primeira escritura, em Lagos, com a presença do Pe. jesuíta Pedro Lopes. Ficou determinado, tanto pelo Geral Aquaviva como pelos doadores, que iriam dar 500$000 réis de juros ou terras que rendessem 20.000 cruzados em dinheiro. Mas já em Lisboa, no dia 26 de Dezembro de 1597 foi feita nova escritura onde o Padre Provincial Cristóvam de Gouveia recebeu de Fernão Telles e sua esposa 20.000 cruzados,[10]representada uma terça parte pela Quinta do Monte Olivete e os outros dois terços por padrões de juros.

O Pe. Provincial deu início no dia 18 de Dezembro de 1598 ao noviciado na Quinta de Campolide, mandando vir quinze noviços dos noviciados dos colégios de Coimbra e Évora, onde se criavam os noviços de toda a Província. O primeiro reitor desta casa foi o Pe António Mascarenhas. [11]

Durante algum tempo procuraram sítio para a casa do noviciado mas devido à impaciência de Fernão Telles resolveram os jesuítas começar a construir em terreno que este deixou em doação.[12] A actual rua do Monte Olivete, perpendicular à Rua da Escola Politécnica corresponderia à antiga Quinta da Cotovia.

Frente à quinta do Monte Olivete ficavam as terras de André Soares e sua esposa Maria Botelho. Ao seu neto chamavam «o da Cotovia» e morava nas casas nobres da quinta da Cotovia, actual Imprensa Nacional.

O sítio era o ideal pois ficava perto da Casa Professa de S. Roque, tinha ótimos ares e muito terreno para cultura e pomares.[13] O terreno de tipo argiloso, muito utilizado pelos oleiros da zona, e de calcário gredoso de cor amarela, dificultou a construção do edifício tendo que se procurar terreno mais firme para as fundações.[14] Encontrou-se no ponto mais alto da quinta, junto à estrada para Campolide. A primeira pedra foi lançada, como já foi referenciado atrás, a 23 de Abril de 1603, catorze anos depois do primeiro contrato para a construção do edifício. A pedra estava toda ornamentada com ramos de folhagem e flores silvestres. Com seis faces, como foi descrito atrás, tendo na sexta face não uma inscrição mas uma concavidade onde Fernão Teles de Meneses colocou um “português de oiro” e medalhas devotas[15]. À cerimónia assistiram os fundadores, o Provincial, o Reitor Padre António Mascarenhas e outros jesuítas vindos dos colégios da Província portuguesa.

Nesta altura da sua vida, o escudo de armas de Fernão Teles de Meneses podia ostentar o leão altivo, de cor púrpura (grandeza e sabedoria elevada)., dos Silvas, o anel encoberto dos Meneses e como símbolo da sua generosidade um campo azul (zelo, lealdade, caridade, justiça, lealdade, beleza e boa reputação) com um coração de ouro (nobreza, riqueza e poder).[16]

Dois anos depois já não assistiu, ao lançamento da primeira pedra da igreja do noviciado, morrendo no dia 26 de Janeiro de 1605. D. Maria de Noronha, sua esposa, pediu que as obras da Capela-mor (do lado do Evangelho) terminassem o mais rápido possível, para lá colocar o túmulo do seu marido, pois os ossos tinham ficado num trono do cruzeiro d igreja de  S. Roque à espera do traslado. Mandou fazer um mausoléu que lhe custou 3.000 cruzados, onde foram colocados primeiro, os ossos de Fernão Teles e em 1623 os seus.

Túmulo de Fernão Teles de Meneses e sua esposa D. Maria de Noronha
Museu/instituição: Museu Nacional de História Natural e da Ciência, Universidade de Lisboa
Denominação: Túmulo/ Túmulo de Fernão Teles de Meneses e sua esposa D. Maria de Noronha
Autor (es): Desconhecido
Datação: Início do século XVII (± 1616)

[1] SOUSA, António Caetano de, História Genealógica da Casa Real Portuguesa, T. IX, p. 333.

[2] , Júlio de, Lisboa antiga : o Bairro Alto, p.27.

[3] SOUSA, António Caetano de, História Genealógica da Casa Real Portuguesa, T. IX, p. 333.

[4] SEQUEIRA, Gustavo Matos, Depois do Terremoto, Lisboa, 1916, p. 205.

[5] Embarcação comprida de fundo chato, de vela e remo.

[6] In http://www.instituto-camoes.pt/…/camoes02.jpg

COUTINHO, B. Xavier Camões e as artes plásticas: subsídios para a iconografia camoneana, 1946-1949,Porto, p.9-18. Nesta iluminura existe uma incógnita relativa ao nome assinado pelo pintor. É composta pelo local e data, mais o nome Pinto e mais um conjunto de sinais orientais, chineses. Xavier Coutinho, coloca a incógnita relativamente ao nome do pintor pois, segundo ele, o nome tanto pode ser Pinto como os símbolos orientais e assim sendo a palavra Pinto seria Pintô.

[7] BARROS, João de, Decadas da Asia, Lisboa, 1788, p. 106-110.

[8]In, http://nautarch.tamu.edu/SHIPLAB/01guifrulopes/Pguinote-naubn2.htm

[9] Em 1587 desembarcaram, na costa algarvia, corsários ingleses comandados pelo almirante Francis Drake que, aproveitando o clima de guerra existente entre a Inglaterra e a Espanha, saqueiam e espalham o terror em muitas zonas do Algarve. In http://www.glosk.com/PO/Sagres/-3009477/pages/Castelo_de_Lagos/1858_pt.htm

[10] B.N.P., Conventos de Lisboa, cód.429, cap. XV, Caza do Noviciado da Companhia de Jesus, ms.

B.N.P., Historia de Lisboa, cód. 145, Da caza do Noviciado da Companhia de Jesus, ms., 1704 a 1708.

[11] Historia da Fundaçam aumento è progresso da casa de provaçam da Compª de Iesu de Lxª Anno de 1597, cap. 3.

[12] Fundaçam aumento…, Cap. VII.

[13] História de Lisboa

[14] História de Lisboa

Fundaçam aumento…, Cap. VIII.

[15] FRANCO, António, Imagem da Virtude…em Lisboa, 1717, p.10.

Cód. 429,  da BNP. Fundaçam aumento…, Cap. VII.

[16] SEQUEIRA, Gustavo Matos, Depois do Terremoto, p. 216.

In VEIGA, Francisca Branco. Noviciado da Cotovia: O Passado dos Museus da Politécnica 1619-1759. Dissertação (Mestrado em Património Cultural) – Universidade Católica Portuguesa, Lisboa, 2009.