
Gravura, pormenor. Constantino Fontes.
Museu da Cidade de Lisboa
Breve cronologia (1821)
22 de abril D. João VI nomeia D. Pedro príncipe regente do Brasil.
25 de abril D. João VI regressa a Portugal após permanecer 13 anos no Brasil.
5 de maio Os bens da Coroa são declarados bens nacionais e incorporados à Fazenda Nacional (Brasil).
3 de julho A esquadra que trouxe D. João VI e a Corte de regresso a Portugal entra na barra do rio Tejo.

Jean Baptiste Debret. Voyage pittoresque et historique au Brésil, ou Séjour d’un Artiste Français au Brésil, depuis 1816 jusqu’en 1831 inclusivement, epoques de l‘avénement et de I‘abdication de S.M. D. Pedro 1er,. Paris: Firmind Didot Frères, 1834-1839. Arquivo Nacional,
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A Revolução de 1820, que já vinha imbuída deste conjunto de antecedentes[1], aos quais podemos adicionar outros eventos como a fundação do chamado “Sinédrio”, integrado por alguns maçons, e que tinha como finalidade a consolidação do Exército Português no país, e a Revolução de 1820 na Espanha que restaura, em março, a Constituição liberal de Cádis (1812), evidenciava uma viragem na mentalidade das elites portuguesas, só quebrada no período de 1829-1834, período do absolutismo miguelista.
Flávio José Gomes Cabral menciona que,
“No dia 22 de outubro de 1820 atracava no porto recifense o paquete inglês Cresterfiel, trazendo as recentes notícias sobre uma revolução iniciada na cidade do Porto no dia 24 de agosto, a qual havia dado início a um movimento de caráter constitucionalista que exigia, entre outras medidas, a convocação de cortes, o que de certa forma punha em xeque a monarquia absoluta”[2].
A ação panfletária e outras manifestações como, por exemplo, modinhas e gestos que iam afligindo o governador de Pernambuco, levou a que no espaço colonial se tenha desenvolvido uma certa repressão e criado condições para que se excedessem os limites que, para a Coroa, eram a sua própria salvaguarda.
Em Pernambuco, existia um alerta quanto à propagação das doutrinas constitucionais uma vez que se ia tomando consciência de uma possível mudança do sistema, da Constituição e das Cortes[3]. Acusavam-se os ingleses de espalhar jornais europeus com novidades acerca desses acontecimentos, cujas matérias eram escritas com grande entusiasmo ajudando a aumentar e a espalhar estes ideais revolucionários por diversas províncias[4].
D. João VI tenta proteger o Reino da entrada dos novos ideais procurando manter um enquadramento ideológico pró Viena. Segundo António Ventura,
“D. João VI reagiu com dureza e determinação perante o ocorrido em Portugal e no Brasil [o processo de Gomes Freire de Andrade e a revolta de Pernanbuco], na linha, aliás, do que já fora solicitado pelo principal Sousa. A portaria de 17 de julho de 1817 proibia a circulação do Correio Brasiliense e de O Português. Em 30 de maio de 1818, um alvará régio de D. João VI secundava a condenação do papa Clemente XII, proibindo as sociedades secretas, incorrendo os seus membros no crime de lesa-majestade, com severas penas que podiam ir até à condenação à morte e ao arresto de bens”[5]
Assim, o regresso de D. João à Portugal ocorreu como consequência direta da Revolução do Porto de 1820 e da convocação das Cortes, que idealizavam o retorno da família real e da Corte portuguesa. Estes acontecimentos foram relevantes e determinantes no juramento da primeira Constituição Portuguesa, em 23 de setembro de 1822[6].
A solenidade da chegada é retratada na iconografia e o regresso do rei é visto como um novo ânimo à nação, como se pode verificar no título da obra publicada na época em Lisboa, por José Daniel Rodrigues da Costa: “Portugal convalescido pelo prazer que presentemente disfruta na desejada, e feliz vinda do seu amabilíssimo monarcha o Sr. D. João VI. e da sua augusta família“.

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4 de Julho de
D. João VI desembarca em Lisboa e jura as bases da Constituição
Notícia da chegada da Família Real a Lisboa é dada no nº 156 do Diário da Regência, 4 de Julho de 1821, edição de 4ª feira:
NOTICIAS NACIONAES.
Lisboa 3 de Julho
Repetidas Salvas das Fortalezas, do Castello, e Embarcações de guerra, annunciarão aos heróicos habitantes desta Capital a feliz chegada do nosso Rei Constitucional. S. M. entrou neste porto a bordo da Náo D. Joã VI seguida de outras embarcações de guerra e mercantes: tendo todos fundeado defronte da Cordoaria; transportou-se imediatamente a bordo a Deputação da Regencia do reino…
(Hemeroteca Municipal de Lisboa)
Notícia que faz referência ao Juramento da Constituição por D. João VI e consequente extinção da Regência do Reino é dada no Suplemento ao nº 157 do Diário da Regência, 5 de Julho de 1821, edição de 5ª feira:
LISBOA, 4 de Julho.
Artigos D’Officio.
AVISO.
As Cortes Gerais, Extraordinarias, e Constituintes da Nação Portugueza Declarão, e Decretão que, Tendo ElRei ratificado o seu juramento ás Bases da Constituição Politica que as mesmas Cortes fizerem (…) e fica por tanto desde já extincta a Regencia do Reino, creada por Decreto de trinta de Janeiro do presente anno.
(Hemeroteca Municipal de Lisboa)
[1] Teve como antecedentes: a invasão de Portugal pelas tropas napoleónicas, em 1807; a transferência da corte portuguesa para o Brasil (1808-1821); a assinatura do Decreto de Abertura dos Portos às Nações Amigas, no dia 28 de janeiro de 1808 e o posterior Tratado de Comércio e Navegação assinado entre Portugal e a Grã-Bretanha em 19 de fevereiro de 1810; situação de miséria económica em Portugal, com fábricas em declínio, a agricultura em decadência, que levou a um colapso das rendas públicas e a miséria social. Mas também contribuíram para esta Revolução Liberal do Porto, uma oposição à influência inglesa nos assuntos internos do Estado; a Conspiração de Lisboa de 1817; a fundação do chamado “Sinédrio”, integrado por alguns maçons, e que tinha como finalidade a consolidação do Exército Português no país; e a Revolução de 1820 na Espanha que restaura, em março, a Constituição de Cádis (1812), e que servia de exemplo para Portugal instalar os ideias do liberalismo. Veja-se VARGUES, Isabel Nobre – “O processo de formação do primeiro movimento liberal: a Revolução de 1820”. In MATTOSO, José (dir.) – História de Portugal, 5º vol.: O Liberalismo. Lisboa: Círculo de Leitores, 1993, pp. 45-63.
[2] CABRAL, Flávio José Gomes – “Vozes Públicas: as ruas e os embates políticos em Pernambuco na crise do Antigo Regime português (1820-1821)”. In SÆCULUM: Revista de História, nº13, (jul./ dez. 2005), pp. 63-64.
[3] BARRETO, Luiz do Rego – Memória justificativa sobre a conducta do marechal de campo Luiz do Rego Barreto durante o tempo em que foi governador de Pernambuco e presidente do governo da mesma província. Lisboa: Typ. de Desidério Marques Leão, 1822, p. 25.
[4] Carta do governador ao Ministério do Reino, 19 de dezembro de 1820. In BARRETO, Luís do Rego – Cartas Pernambucanas, vol. LII. Recife, 1979, pp. 156-157; BERNARDES, Denis – O patriotismo constitucional: Pernambuco, 1820-1822. Ed. Universitária UFPE, 2006, pp. 361-366.
[5] VENTURA, António – Uma História da Maçonaria em Portugal. Lisboa: Círculo de Leitores, 2013, p. 98.
Veja-se, inclusive, o Aviso dos Governadores do Reino em nome d’El Rei ao Presidente e Deputados da Real Junta do Commercio para “… mandar immediatamente bloquear o porto, e costas de Pernambuco e enviar um corpo das mesmas tropas, […] castigando os pérfidos, que se arrojáraõ a tramar taõ detestável traiçaõ”. In O Investigador Português em Inglaterra …, vol. XIX, nº LXXIII, julho de 1817, pp. 86-87 e, Conspiração Portugueza (artigo copiado do Times de 21 de junho de 1817). Ibidem, pp.108-109.
[6] MANIQUE, António Pedro – Portugal e as Potências Europeias (1807-1847). Lisboa: Liv. Horizonte, 1988, pp. 41-44.
Entre 1820 e 1834 Portugal vai passar por um conjunto de mudanças de regime político e de governo, umas da responsabilidade dos liberais, outras dos absolutistas.