1807-1821 Inversão Metropolitana (PT/BR)

Pela primeira e única vez na história uma colónia passava a ser a sede de uma corte europeia – acontecimento que alguns historiadores denominaram de “inversão metropolitana”.

A família real embarca para o Brasil. (Aguarela de Alfredo Roque Gameiro (1864-1935).
FRANCO, Chagas; SOARES, João – Quadros da História de Portugal. Lisboa: Pap. Guedes, 1917, 7º Ciclo – O tempo dos franceses até ao constitucionalismo – Ilustrações de Roque gameiro, Cap. 33 – A Primeira Invasão Francesa.
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26º Rei de Portugal – D. Maria I – A Piedosa
Filha de D. José I e de D. Mariana Vitória de Bourbon.
Nasceu em Lisboa em 1734.
Casou com o seu tio D. Pedro, que, por isso, tomou o título de D. Pedro III.
Aclamada Rainha em 1777. Reinou 39 anos.

27º Rei de Portugal – D. João VI – O Clemente
Filho de D. Maria I e de D. Pedro III.
Nasceu em Lisboa 1767.
Casou com D. Carlota Joaquina de Bourbon.
Aclamado Rei em 1816. Reinou 10 anos.

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No início do século XIX, em Portugal, tal como em Espanha, vivia-se um período politicamente revoltoso. O reino português encontrava-se empobrecido e esgotado depois de se ter envolvido numa crise motivada, entre outras razões, pelo refúgio forçado da família real no Brasil (29 de novembro de 1807), pelo alcance destruidor das três invasões napoleónicas (1ª invasão – 1807-1808; 2ª invasão – 1809; 3ª invasão – 1810-1811) e pela abertura dos portos do Brasil ao comércio mundial (decreto de 28 de janeiro de 1808), provocando a ruína económica portuguesa e consequente domínio dos ingleses sobre Portugal até à Revolução de 1820.

Como refere José Miguel Sardica, “A partir do momento em que a Revolução Francesa assumiu, por razões geoestratégicas, políticas, económicas e até ideológicas, uma essencial dinâmica de confronto entre o continente e os mares, Portugal e Espanha foram aspirados para o centro do turbilhão europeu”[1].

Portugal, na defesa dos seus interesses na metrópole e nas colónias, vai valorizar a sua aliança tradicional com a Inglaterra motivando uma tomada de posição inflexível contra a França. Por sua vez, a Espanha aceita sem protestar o Bloqueio Continental do imperador Napoleão Bonaparte aos navios do Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda e, não colocando objeções à França, deixa, em 1807, o exército francês abastecer-se e atravessar o seu território, em troca de uma parte de Portugal como referido no Tratado franco-espanhol de Fontainebleau, dando origem à primeira invasão francesa de Portugal e à retirada da Corte e da família real para o Brasil[2].

No dia 29 de novembro de 1807, o Príncipe Regente ordenou a partida para o Brasil. A esquadra portuguesa, que saiu do porto de Lisboa, ia comandada pelo vice-almirante Manuel da Cunha Souto Maior.  Quatro naus da Marinha Real Britânica, sob o comando do capitão Graham Moore, reforçaram a esquadra portuguesa.

O general Andoche Junot entrou em Lisboa às 9 horas da manhã do dia 30 de novembro, à frente de um exército francês com cerca 26 mil homens.

No dia 30 de novembro de 1807, as tropas francesas comandadas pelo general Junot chegam a Lisboa.

 

Junot Protegendo a Cidade de Lisboa
Domingos Sequeira, 1808

Pela ação destrutiva que tiveram as invasões napoleónicas e pela permanência da corte portuguesa no Brasil instalou-se em Portugal uma profunda crise política, económica e social. O mal-estar aumentava ainda mais devido à condição sui generis das forças britânicas em Portugal. Como refere Ana Cristina Araújo,

“Com o objectivo de manter «a melhor inteligência» com Sua Majestade Britânica, o príncipe D. João impõe, a 6 de Julho de 1809, a redução da Regência para três membros, concedendo a sir Arthur Wellesley, marechal-general do exército português, o direito de participar nas reuniões daquele órgão do Estado. Os ingleses continuaram por detrás da reforma do Governo, de Maio de 1810, que consagra, na esfera do executivo, o conde de Castro Marim, o conde de Redondo, o principal Sousa, o lente Ricardo Raimundo Nogueira e o então patriarca de Lisboa, para além do ministro plenipotenciário Charles Stuart, que pouco depois abdica do direito de voto sobre questões militares e financeiras em favor de Beresford, prerrogativa usada pelo comandante-chefe dos exércitos de forma progressivamente discricionária e despótica”[3]

Arrival of the Prince, the Royal Family and the Court at the Church of Our Lady of the Rosary for a mass held in honour of their safe arrival from Rio de Janeiro.
Oil on canvas. Armando Martins Viana. 19th century.
Museu da Cidade, Rio de Janeiro

Instalada a corte e todo o aparelho de Estado no Rio de Janeiro, esta torna-se “a nova capital” do Império e é daí que saí, em 1808, o Decreto de Abertura dos Portos «às Nações Amigas», perdendo o direito ao monopólio da exploração da colónia, que obrigava todos os produtos das colónias a passarem antes pelas alfândegas da metrópole. Este decreto favorecia os interesses da Inglaterra, sendo que alguns pontos desse decreto já constavam do Tratado de Westminster, de 1654, como as referentes à liberdade religiosa nos domínios portugueses (14º) e a concessão de direitos judiciais, fiscais e económicos para britânicos residentes no reino português (5º, 8, 9º e 13º);[4]. Em 1810, assina-se com este país os Tratados de Comércio e Navegação e o de Aliança e Amizade que permitiram a hegemonia britânica nas relações comerciais entre ambos os países, assegurando aos Britânicos o acesso preferencial dos seus produtos a todos os territórios portugueses, com a concessão de privilégios especiais, mesmo em relação aos produtos portugueses, abrindo as portas de um mercado em três continentes, com tarifas alfandegárias privilegiadas. O fim do pacto colonial e abertura do Brasil ao comércio mundial provocou, na opinião de Rui Carlos A. Lopes, uma quebra de 75% do comércio externo e a ruína de muitos comerciantes que até então beneficiavam do monopólio da navegação transatlântica[5]. Deve-se realçar que o monopólio e o exclusivo do comércio eram a principal razão de ser da condição colonial, orientada em proveito da metrópole, e ao mesmo tempo motivo de oposição por parte da colónia, pois era um handicap no seu desenvolvimento[6].

Chegada da frota portuguesa no Rio de Janeiro, com destaque a nau Príncipe Real ao centro, e o Pão de Açúcar ao lado direito. Ilustração de Geoff Hunt.

A partir de 1808 aumenta a situação de miséria económica em Portugal com fábricas em declínio e a agricultura abandonada. Desde 1809 que o comandante do exército português é o general Beresford, nomeado com plenos poderes, impunha medidas repressivas, não poupando os quadros superiores do exército nacional[7]. As relações entre exército, isto é, os elementos ingleses, e junta governativa tornam-se tensas e difíceis.

No dia 2 de janeiro de 1815 a Gazeta de Lisboa expressava o sentimento geral de satisfação que existia na Europa face à queda do império napoleónico e às expetativas que trazia o Congresso de Viena:

“Começa finalmente hum ano de paz, depois de tantas e sanguinozas guerras; respira a humanidade, tanto tempo opressa pela tyrannia; e se o anno passado há de ser eternamente memorável pelo estrondo das victorias que conquistarão a paz da Europa, desthronárão o Despota, e restituírão os thronos aos legítimos Soberanos, não o ficará sendo menos o presente pelo complemento que a esta grande obra hão de pôr os Monarcas por meio do Congresso de Vienna, cujas decisões acertadas esperamos satisfarão a toda a família Européa”[8].

No Congresso, os representantes portugueses promoveram a anulação do Tratado de comércio, o que tendo em consideração os interesses ingleses em jogo, foi prontamente recusado pelo Visconde de Castlereagh (1769-1822), representante britânico no Congresso[9].

Os representantes portugueses argumentaram que o tratado de comércio e de navegação de 1810 só tinha sido posto em vigor por Portugal e que a Inglaterra sempre evitara o seu cumprimento quando se tratava dos seus interesses. Também pretendiam a anulação das cláusulas de aliança e amizade, que impunham a Portugal a cedência ao governo britânico por cinquenta anos das colónias de Bissau e Cacheu, e restringiam o comércio de africanos às possessões portuguesas na costa de África (chamada pelos portugueses Costa da Mina), e nos territórios de Cabinda e Molembo (art. X).

Príncipe regente Dom João VI, Conde da Ponte – Arquivo Nacional do Brasil – Biblioteca Nacional do Brasil
Decreto de Abertura dos Portos às Nações Amigas.

A hegemonia marítima inglesa tentou impor-se no tráfico de escravos. As propostas de abolição da escravatura feitas pelos ingleses tinham um verdadeiro objetivo material, isto é, satisfazer as exigências postas pela sua crescente produção industrial. Nesse sentido, é assinado no dia 22 de janeiro de 1815 um tratado com a Inglaterra onde ficou decidido que ficava proibido traficar escravos (sem se abolir a escravatura) em qualquer parte da costa de África até ao norte do Equador.

Pretendiam os ingleses ficar com o direito de vigilância e consequente direito de visita dos navios em alto mar a fim de fiscalizar o cumprimento da proibição decretada. A Inglaterra aconselhava a abolição completa, o que para os portugueses iria prejudica muito a economia no Brasil, pois a mão-de-obra escrava era considerada muito necessária à economia brasileira. Em relação ao tratado de comércio e navegação, este vai ficar em vigor até 1835.

Segundo os princípios adotados pelo Congresso de Viena, a questão da Casa de Bragança não se encontrar na Europa teria de ser tratada. Assim, a solução proposta pelo representante francês no congresso, o príncipe Charles-Maurice de Talleyrand, que foi a que D. João VI acabou por adotar, foi a elevação da colónia brasileira à condição de Reino Unido, igualando o seu estatuto ao da metrópole (D. João passou a ostentar o título de Príncipe Real do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves, e mais tarde rei das três coroas unidas, entre as quais, aquela onde residia como Rei do Brasil).

O representante inglês também concordou com a ideia, que resultou na efetiva criação do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves em 16 de dezembro de 1815, instituição jurídica rapidamente reconhecida pelas outras nações. Esta medida, além de defender a presença da Europa e da realeza na América, também agradou à colónia brasileira que se viu elevada a Reino do Brasil, ajudando, deste modo, a afastar a ideia da sua independência[10].

Com a Corte sediada no Brasil, o rei D. João VI criou a Real Biblioteca (hoje conhecida como Biblioteca Nacional) para abrigar os 60 mil livros levados de Portugal. Também foram construídos o Museu Real, o Jardim Botânico do Rio de Janeiro, a primeira escola de Medicina do Brasil, o Banco do Brasil e a Escola de Belas Artes, entre outros.

Em 1820, após a derrota de Napoleão, a transferência da Corte para o Brasil veio também a ter como consequência a Revolução de 1820. Portugal continental encontrava-se em situação de crise, decadência e ruína, e exigia-se o retorno da família real portuguesa e da Corte a Lisboa.

família real fez a viagem de regresso a Lisboa entre 26 de abril e 3 de julho de 1821, depois de mais de 13 anos de ausência. 

Constantino de Fontes. Desembarque d’el rei dom João acompanhado por uma deputação das Cortes: … em 4 de julho d’1821 regressando do Brazil. [S.l.: s.n., 18–?]. Gravura: buril e pontilhado.


[1] SARDICA, José Miguel – A Europa Napoleónica e Portugal. Lisboa: ed. Tribuna, 2011, p. 128.

[2] Sobre este assunto veja-se, VENTURA, António – A Guerra das Laranjas, 1801. In Academia Portuguesa de História, Guerras e Campanhas Militares. Lisboa, julho de 2008; Idem – “Portugal e a Espanha em Vésperas da Guerra das Laranjas. As Questões Militares”. Atas do XI Colóquio de História Militar, Comissão Portuguesa de História Militar. Palácio da Independência, Lisboa, 2001; ARAÚJO, Ana Cristina – “As invasões francesas e a afirmação das ideias liberais”. In MATTOSO, José (dir.) – História de Portugal, 5º vol.. Lisboa: Círculo de Leitores, 1993, pp. 17-18; SARDICA, José Miguel – ibidem, p. 132; MACEDO, Jorge Borges de – História Diplomática Portuguesa. Constantes e Linhas de Força, 2ª ed.. Lisboa: Instituto da Defesa Nacional/Tribuna da História, 2006, p. 394.        

[3] ARAÚJO, Ana Cristina – ibidem, p. 40.

[4] O comércio com o Brasil era especialmente realçado neste Tratado, tendo os mercadores britânicos livre participação no comércio no território brasileiro com a metrópole portuguesa, com exceção de cinco produtos (farinha, peixe, vinho, azeite e pau-brasil), permanecendo estes como exclusivo da Companhia do Brasil (art. 11º).

[5] LOPES, Rui Carlos Antunes Almeida – Un Bibliotecario ilustrado en el Ejército Portugués: el P. Ernesto Augusto Pereira de Sales, (1864-1946). Dissertação de Doutoramento apresentada à Universidad Complutense de Madrid, Facultad de Ciencias de la Información, 2015, p. 31.

[6] LUCAS, Maria Manuela – “Organização do Império”. In MATTOSO, José (dir.) – História de Portugal, 5º vol.. Lisboa: Círculo de Leitores, 1993, pp. 285-287; PEREIRA, Miriam Halpern – Revolução, Finanças, Dependência Externa: (De 1820 à Convenção de Gramido). Lisboa: Sá da Costa Editora, 1979, pp. 36 – 37.                 

[7] A título de exemplo, a execução, em 1817 do general Gomes Freire de Andrade sob a acusação de franco-maçonaria e tentativa de conspiração liberal.

[8] Gazeta de Lisboa, 2 de janeiro de 1815, p. 5. Os artigos mais importantes para Portugal no ato final do Tratado saído do Congresso de Viena são os artigos 105, 106 e 107 que podem ser lidos em, SILVA, Luiz Augusto Rebelo da – Quadro Elementar Das Relações politicas e Diplomaticas de Portugal, Tomo XVIII. Lisboa: Typ. da Academia Real das Sciencias, 1860, pp. 501-502. Vide Anexo 2.

[9] Declaração de anulação do tratado de comércio de 1810 entre Portugal e Inglaterra com base nas declarações dos plenipotenciários ddos dois países durante o Congresso de Viena. [Consultado 18 nov. 2015]. Disponível na internet em: <https://bdlb.bn.gov.br/acervo/handle/123456789/274726&gt;

[10]  D. João, interessado na manutenção da soberania portuguesa do espaço colonial, ameaçado pela ascendência norte-americana e inglesa fez publicar em 16 de dezembro de 1815 a Carta de Lei onde afirmava: “Que os meus Reinos de Portugal, Algarves, e Brasil formem dora em diante um só e único Reino debaixo do título de REINO UNIDO DE PORTUGAL, E DO BRASIL, E ALGARVES”. Esta lei saudada no Rio, não foi tão bem-recebida em Portugal. A elevação a Reino Unido colocava o Brasil em condições de igualdade ou até em situação superior a Portugal, dado que a Corte permanecia no Rio de Janeiro. A notícia só é publicada em Lisboa em 1816, no nº 299 da Gazeta de Lisboa, 17 de dezembro de 1816, edição de 3ª feira.

Veja-se CIRCULARES DO MINISTÉRIO DOS NEGÓCIOS ESTRANGEIROS – 1815-1870, Circular de 23 de dezembro de 1815. Índice: “Participando a elevação do Estado do Brasil à dignidade de Reino, e unido aos de Portugal e dos Algarves, por Carta de Lei de 16 de Dezembro de 1815, da qual se incluíram alguns exemplares.”. In AHI 317/03/06 (Arquivo Histórico do Itamaraty, Rio de Janeiro). Vide Anexo 3; BONAVIDES, Paulo; AMARAL, Roberto – Textos Políticos da História do Brasil, 3ª ed., vol.I. Brasília: Conselho Editorial do Senado Federal, 2002, nº 41 (Elevação do Brasil à categoria de Reino – Carta de Lei do Príncipe D. João (18 de dezembro de 1815)).

A defesa da ação colonialista na América levou a que os britânicos não quisessem fazer parte da Santa Aliança dado que esta incluía a hipótese de intervir nas independências da América. O afastamento inglês justifica-se pelo interesse da Coroa Britânica em alargar os seus negócios com as recém-independentes nações, das amarras impostas pelo pacto colonial. Em contrapartida, o governo francês, visando recuperar o seu prestígio diplomático, decidiu juntar-se às restantes monarquias em sinal de fidelidade. SARDICA, José Miguel – ibidem, pp. 347-349.

Também a ameaça dos Estados Unidos quanto a uma possível intervenção na América Latina era uma realidade exequível, uma vez que já eram o mais importante país das Américas, embora ainda lá existissem algumas possessões coloniais.

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VEIGA, Francisca Branco (2024), 1807-1821 Inversão Metropolitana (PT/BR) (blogue da autora Francisca Branco Veiga). Disponível em: https://franciscabrancoveiga.com/ [20 de Agosto de 2024].

In VEIGA, Francisca Branco. Companhia de Jesus. O breve regresso no reinado de D. Miguel. Ed. de Autor, 2023, pp. 437.

Disponível em: https://www.amazon.es/Companhia-Jesus-Regresso-Reinado-Miguel/dp/B0C2RRNZDQ

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JOSÉ ANCHIETA (1534 – 1597): curiosidades acerca do humanista

Do Brasil escreve aos seus irmãos de fé: 

«Não basta sair de Coimbra com um fervor que logo murcha, antes mesmo de cruzar o equador e desejar voltar para Portugal. É necessário ter os alforjes cheios para durar até ao final do dia»

Gravura anónima do “Venerabilis P. Ioseph Anchieta e(x) Societate Iesu”. In Simão de Vasconcelos, Vida… (Lisboa, 1672).

Foi, ainda noviço para o Brasil, a 8 de maio de 1553, na 3.ª Expedição de Missionários Jesuítas, chefiada pelo Padre Luiz de Grã e na armada de Duarte Góis.

José de Anchieta e outros religiosos subiram a Serra do Mar rumo ao Planalto, onde se instalaram. A inauguração do barracão do planalto deu-se junto a uma aldeia de índios no dia 24 de JANEIRO de 1554, dia da conversão do Apóstolo São Paulo, local onde os jesuítas precisavam de tradutores e de intérpretes da língua indígena Tupi. No local, Nóbrega com a ajuda de Anchieta celebraram uma missa, em homenagem ao Santo – dava-se início à FUNDAÇÃO da cidade de SÃO PAULO.

Em 1566, Anchieta foi ordenado padre. Dirigiu o Colégio dos Jesuítas no Rio de Janeiro entre 1570 e 1573 e foi Provincial da Companhia de Jesus no Brasil durante dez anos.

A 9 de julho de 1597, José de Anchieta faleceu em Reritiba (atual Anchieta), aldeia que fundara, no Estado do Espírito Santo (Brasil).

Em 1611, os seus restos mortais foram transladados: uma parte, para o Colégio da Baía, a outra, para Roma.

Na Conferência proferida na biblioteca da Faculdade de Direito de São Paulo, a 24 de setembro de 1896, na presença dos lentes da Faculdade, do Presidente do Estado, autoridades e representantes do clero, grande número de Senhoras e cavalheiros e sob a Presidência de João Monteiro, vice-director da Faculdade, Brazilio Machado descrevia o padre Anchieta da seguinte forma:

« Era o padre Anchieta de mediana estatura, de compleição robusto, porém, descarnado; tinha pouca barba, olhos azues, cabeça grande; seu aspecto, tão magestoso quanto affavel, inspirava, em quantos o conversavam, confiança e amor!»*

Obra que integra o acervo do Museu Paulista da USP. Coleção Fundo Museu Paulista (Museu do Ipiranga) – FMP, 1920.
“Às estrelas por caminhos difíceis” – A frase em latim no quadro de José Anchieta, de autoria do pintor Oscar Pereira da Silva (1865-1939), é um dos lemas fundamentais na Companhia de Jesus.

Em 1595, escreveu «Arte da Gramática da Língua mais Conhecida na Costa do Brasil», o tupi-guarani, que foi publicada em Coimbra, por Antônio Mariz, em 1595. Esta obra teve um caráter pioneiro pela sua importância para o conhecimento do tupi falado no século XVI, a qual era, até então, exclusivamente oral. Outro jesuíta, como por exemplo, o padre basco João de Azpilcueta Navarro compôs os primeiros hinos religiosos nas suas pregações aos indígenas.

In http://objdigital.bn.br/acervo_digital/div_obrasraras/or812098/or812098.pdf

Índice

  1. Das letras – Cap. I 
  2. Da ortografia ou pronunciação – Cap. II 
  3. De accentu – Cap. III 
  4. Dos nomes – Cap. IIII 
  5. Dos pronomes – Cap. V 
  6. Dos verbos – Cap. VI
  7. Anotações, na conjugação – Cap. VII 
  8. Da construção dos verbos ativos – Cap. VIII 
  9. De algumas maneiras de verbos em que esta anfibologia se tira – Cap. IX 
  10. Das preposições – Cap. X 
  11. De sumesfui – Cap. XI 
  12. Dos verbos neutros feitos ativos – Cap. XII 
  13. Dos ativos feitos neutros – Cap. XIII 
  14. Da composição dos verbos – Cap. XIIII 
  15. Da repetição dos verbos – Cap. XV 
  16. De alguns verbos irregulares de  – Cap. XVI 

José de Anchieta : Padre Jesuíta e Apóstolo do Brasil
Date: [18–]
Description: “Nascido a 7 de abril de 1534 em Teneriffe, Fallecido a 9 de junho de 1597…”
Zincogravura, p&b
In https://acervobndigital.bn.gov.br/sophia/index.html

*In III Centenário do Veneravel Joseph Anchieta, 1900.

José de Anchieta e o Nascimento da Tradição Natalícia no Brasil

São José de Anchieta foi um verdadeiro pioneiro das artes e da evangelização no Brasil, destacando-se também na representação do mistério do Natal. Em 1553, ainda como noviço jesuíta, apresentou pela primeira vez no país a cena do Presépio, em São Vicente, no actual estado de São Paulo, dirigindo-se aos indígenas e aos filhos dos colonos portugueses. Este facto é registado com rigor pelo Santuário Nacional de São José de Anchieta, situado na cidade Anchieta que hoje tem o seu nome.

Para a construção do Presépio, Anchieta envolveu os indígenas da região, valorizando as suas técnicas tradicionais de cerâmica. Desta forma, soube transmitir ao catolicismo nascente no Brasil a antiga tradição natalícia medieval, iniciada por São Francisco de Assis em Greccio, na Itália, no ano de 1223 — uma herança espiritual que chegou até aos nossos dias, apesar das profundas crises religiosas que marcaram a Igreja após o Concílio Vaticano II.

Primeiro presépio da História, criado por São Francisco de Assis no Natal de 1223, na localidade de Greccio, em Itália.
A imagem reproduz a Natividade (1490), o imponente presépio em terracota policromada do escultor italiano Andrea della Robbia, conservado na igreja de Santa Maria degli Angeli, no Santuário de La Verna, em Arezzo, Itália. Com grande delicadeza, a cena apresenta Jesus rodeado pela Virgem Maria, São José, São Francisco e Santo António de Lisboa.
“Presépio Franciscano”
Vista Alegre

A pedido do Padre Manuel da Nóbrega, José de Anchieta escreveu igualmente uma peça teatral de Natal, cuidadosamente adaptada à realidade e à sensibilidade dos índios de São Lourenço, localidade que corresponde hoje à cidade de Niterói.

Nesta obra, o grande Apóstolo do Brasil não hesitou em denunciar o estado moral e espiritual desses povos, imaginando um diálogo tocante entre um pecador — o indígena — que se aproxima do Presépio e do Menino-Deus, descrito com ternura como “o menino mui formoso, santo menino, nas palhinhas deitado para salvação do pecado”. Através desta linguagem simples e profundamente humana, Anchieta procurava tocar os corações e conduzi-los ao mistério redentor do Natal.

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VEIGA, Francisca Branco, Padre JOSÉ DE ANCHIETA (1534 – 1597) (blogue da autora Francisca Branco Veiga). Disponível em: https://franciscabrancoveiga.com/ [02 de Maio de 2024].

https://www.youtube.com/TertuliasPortugalBrasil (Ep. 87)

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O NASCIMENTO DE D. MARIA II

(Rio de Janeiro, 4 de abril de 1819 – Lisboa, 15 de novembro de 1853)

princesa Dona Maria da Glória Joana Carlota Leopoldina da Cruz Francisca Xavier de Paula Isidora Micaela Gabriela Rafaela Gonzaga de Bragança, nasceu a 4 de abril de 1819, domingo de Ramos, no Rio de Janeiro, filha do Imperador D. Pedro I do Brasil e de Maria Leopoldina de Áustria. Nasceu em terras brasileiras, no palácio da Boavista. Aí se tinham refugiado estrategicamente os seus avós D. João VI e D. Carlota Joaquina e a restante corte após a invasão da metrópole pelos franceses.

Seria a futura rainha de Portugal, D. Maria II.

Segunda rainha reinante de Portugal e trigésimo monarca português (1834-1853), ficou conhecida pelo cognome de “a Educadora”.

– Cortejo do batismo da princesa real D. Maria da Glória, no Rio de Janeiro. Prancha 44, volume III, Voyage pittoresque et historique au Brésil. Jean Baptiste Debret. França, 1834 a 1839. National Library collection. Brasiliana Iconográfica.

A notícia do nascimento da princesa D. Maria da Glória é dada no nº 176 da Gazeta de Lisboa, 26 de Julho:

LISBOA(…)

«Havendo-se dignado Deos Nosso Senhor de felicitar estes Reinos com o Nascimento de huma Princeza da Beira, que a Serenissima Senhora Princeza Real do Reino Unido de Portugal, Brasil, e Algarves deo à luz no dia 4 de Abril do presente anno com feliz secesso: Foi S. M. Servido que por ocasião deste plausível motivo hovesse três dias de luminárias, repiques e salvas de artilheria nesta Capital, e em todas as Cidades e Villas destes Reinos, bem como nos seus Castellos, Torres e Fortalezas, as quaes demonstrações festivas hão de começar hoje 28 do corrente mez, e continuar nos dois próximos seguintes em que deve suspender-se o Despacho em todos os Tribunaes». Biblioteca Nacional de Portugal

Rainha D. Maria II de Portugal, em criança. Séc. XIX. Autor desconhecido.
Fonte: Palácio do Correio Velho

A obra musical interpretada na cerimónia religiosa do seu batizado, realizado no Rio de Janeiro em 3 de Maio de 1819, foi o Hino Te Deum do compositor luso-brasileiro Marcos Portugal (Lisboa, 1762 – Rio de Janeiro, 1830), segundo fontes do periódico Gazeta do Rio de Janeiro , de 5 de Maio de 1819:

“A Serenissima Senhora Princeza da Beira Houve o Nome de D. MARIA DA GLORIA JOANNA CARLOTA LEOPOLDINA IZIDORA DA CRUZ FRANCISCA XAVIER DE PAULA MICAELA GABRIELA RAFAELA LUIZA GONZAGA. Depois entoou o mesmo Excellentissimo Bispo o hymno Te Deum, que foi cantado pelos Musicos da Real Camara e Capella, com Musica composta e dirigida pelo celebre Marcos Portugal, Mestre de SS. AA. RR., assim como muitas agradaveis symphonias, que se tocarão em todo o tempo que durou esta augusta cerimonia”.

– O quadro retrata a imperatriz Leopoldina com os seus filhos. No colo, está o futuro imperador do Brasil, Pedro II. À esquerda, de baixo para cima, estão: Paula, Januária e Francisca de Bragança; na direita, está Maria, futura rainha de Portugal. Pintor, Domenico Failutti. Data de criação, 1921. Localização, Museu do Ipiranga.

D. Maria II foi, sucessivamente, princesa da Beira (1819-1822), princesa imperial do Brasil (1822-1825), princesa do Grão-Pará (1825-1826) e rainha de Portugal (1826-1853). 

D. Pedro IV de Portugal abdicou da coroa portuguesa em nome da sua filha, D. Maria II, a 3 de maio de 1826. 

Documento pelo qual D. Pedro I do Brasil e IV de Portugal abdicou ao trono de Portugal em 2 de maio de 1826. O documento menciona o então título constitucional de realeza que ela tinha perante à Constituição brasileira de 1824, Princesa do Grão-Pará. In Manifesto dos direitos de Sua Magestade Fidelissima, a senhora dona Maria Segunda, e exposição da questão protugueza (IA manifestodosdire00guer 0).pdf

No dia 23 de setembro de 1833, D. Maria II chega a Lisboa, vinda de França, acompanhada da madrasta, D. Amélia de Leuchtenberg e da irmã, a princesa D. Maria Amélia de Bragança (1831-1853).

CASAMENTOS

  • Com dispensa papal, por procuração, em 29 de outubro de 1826 casou com seu tio, o infante Miguel (1802-66). O casamento foi dissolvido ou declarado nulo em 1 de dezembro de 1834.
  • Casou em Munique por procuração em 1 de Dezembro de 1834 e em pessoa em Lisboa em 26 de janeiro de 1835 com o príncipe Augusto de Beauharnais, nascido a 9 de dezembro de 1810, Duque de Leuchtenberg (Pais : M Eugène de Beauharnais 1781 & F Augusta, Princesa da Baviera 1788-1851).
  • Casada a 9 de abril de 1836, com D. Fernando de Saxe-Coburgo e Gotha, sobrinho do rei Leopoldo I dos belgas, nascido a 29 de outubro de 1816 – Vieina, Áustria, falecido a 15 de dezembro de 1885 – Lisboa, Lisboa, Portugal com a idade de 69 anos.

No seu reinado assiste-se ao nascimento de um novo quadro político, o triunfo do liberalismo, e foi marcado pelo influxo do romantismo.

Foi rainha em dois períodos distintos:

– 2 de maio de 1826 a 11 de julho de 1828 (ainda no Brasil);

– 26 de maio de 1834 a 15 de novembro de 1853 (em Portugal).

Sobre D. Maria, escrevia Almeida Garrett, no exílio:

“Uma princesa que tem de reinar por si e por seu próprio direito, é fêmea de facto e varão de direito e a educação tem, neste caso, de contrastar a natureza e diminuir quanto é possível a mulher para que só fique a rainha”.

Figura-chave no estabelecimento do Ensino Primário gratuito em Portugal.

Bandeira Nacional em vigor desde o reinado de D. Maria II até ao final do reinado de D. Manuel II

Morreu aos 34 anos no nascimento do seu 11º filho, que também morreu. 

Como referir este artigo:

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VEIGA, Francisca Branco (2024), O NASCIMENTO DE D. MARIA II (blogue da autora Francisca Branco Veiga). Disponível em: https://franciscabrancoveiga.com/ [04 de Abril de 2024].

#franciscabrancoveiga #historia4all #franciscaveiga #DMariaII #4deabril #brasil

Veja-se, VEIGA, Francisca Branco (2019, nov.). 1832-1834 Regência de D. Pedro em nome de sua filha D. Maria da Glória: fim do governo temporal da Igreja Católica e das Ordens Religiosas em Portugal. In SOARES, Clara Moura; MALTA, Marize (eds.), D. Maria II, princesa do Brasil, rainha de Portugal Arte, Património e Identidade, Lisboa: Palácio Nacional da Ajuda, 12 nov. (pp. 113-120). ARTIS – Instituto de História da Arte da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.

VEIGA, Francisca Branco (2023), Companhia de Jesus. O breve regresso no reinado de D. Miguel. Ed. de Autor.

Acontecimentos relevantes que promoveram o regresso a Portugal da Corte no dia 3 de julho de 1821

Desembarque d’El Rei Dom João VI. Acompanhado por uma Deputação das Cortes, Na Magnifica Praça do Terreiro do Paço em 4 de Julho de 1821, regressando do Brasil.
Gravura, pormenor. Constantino Fontes.
Museu da Cidade de Lisboa

Breve cronologia (1821)

22 de abril D. João VI nomeia D. Pedro príncipe regente do Brasil.

25 de abril D. João VI regressa a Portugal após permanecer 13 anos no Brasil.

5 de maio Os bens da Coroa são declarados bens nacionais e incorporados à Fazenda Nacional (Brasil).

3 de julho A esquadra que trouxe D. João VI e a Corte de regresso a Portugal entra na barra do rio Tejo.

Partida da rainha D. Carlota Joaquina para Portugal, em litografia incluída no livro Viagem pitoresca, publicado em 1839, de Jean-Baptiste Debret (1768-1848).

Jean Baptiste Debret. Voyage pittoresque et historique au Brésil, ou Séjour d’un Artiste Français au Brésil, depuis 1816 jusqu’en 1831 inclusivement, epoques de l‘avénement et de I‘abdication de S.M. D. Pedro 1er,. Paris: Firmind Didot Frères, 1834-1839. Arquivo Nacional,

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A Revolução de 1820, que já vinha imbuída deste conjunto de antecedentes[1], aos quais podemos adicionar outros eventos como a fundação do chamado “Sinédrio”, integrado por alguns maçons, e que tinha como finalidade a consolidação do Exército Português no país, e a Revolução de 1820 na Espanha que restaura, em março, a Constituição liberal de Cádis (1812), evidenciava uma viragem na mentalidade das elites portuguesas, só quebrada no período de 1829-1834, período do absolutismo miguelista.

Flávio José Gomes Cabral menciona que,

“No dia 22 de outubro de 1820 atracava no porto recifense o paquete inglês Cresterfiel, trazendo as recentes notícias sobre uma revolução iniciada na cidade do Porto no dia 24 de agosto, a qual havia dado início a um movimento de caráter constitucionalista que exigia, entre outras medidas, a convocação de cortes, o que de certa forma punha em xeque a monarquia absoluta”[2].

A ação panfletária e outras manifestações como, por exemplo, modinhas e gestos que iam afligindo o governador de Pernambuco, levou a que no espaço colonial se tenha desenvolvido uma certa repressão e criado condições para que se excedessem os limites que, para a Coroa, eram a sua própria salvaguarda.

Em Pernambuco, existia um alerta quanto à propagação das doutrinas constitucionais uma vez que se ia tomando consciência de uma possível mudança do sistema, da Constituição e das Cortes[3]. Acusavam-se os ingleses de espalhar jornais europeus com novidades acerca desses acontecimentos, cujas matérias eram escritas com grande entusiasmo ajudando a aumentar e a espalhar estes ideais revolucionários por diversas províncias[4].

D. João VI tenta proteger o Reino da entrada dos novos ideais procurando manter um enquadramento ideológico pró Viena. Segundo António Ventura,

“D. João VI reagiu com dureza e determinação perante o ocorrido em Portugal e no Brasil [o processo de Gomes Freire de Andrade e a revolta de Pernanbuco], na linha, aliás, do que já fora solicitado pelo principal Sousa. A portaria de 17 de julho de 1817 proibia a circulação do Correio Brasiliense e de O Português. Em 30 de maio de 1818, um alvará régio de D. João VI secundava a condenação do papa Clemente XII, proibindo as sociedades secretas, incorrendo os seus membros no crime de lesa-majestade, com severas penas que podiam ir até à condenação à morte e ao arresto de bens”[5]

Assim, o regresso de D. João à Portugal ocorreu como consequência direta da Revolução do Porto de 1820 e da convocação das Cortes, que idealizavam o retorno da família real e da Corte portuguesa. Estes acontecimentos foram relevantes e determinantes no juramento da primeira Constituição Portuguesa, em 23 de setembro de 1822[6].

A solenidade da chegada é retratada na iconografia e o regresso do rei é visto como um novo ânimo à nação, como se pode verificar no título da obra publicada na época em Lisboa, por José Daniel Rodrigues da Costa: “Portugal convalescido pelo prazer que presentemente disfruta na desejada, e feliz vinda do seu amabilíssimo monarcha o Sr. D. João VI. e da sua augusta família“.

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4 de Julho de

D. João VI desembarca em Lisboa e jura as bases da Constituição

Notícia da chegada da Família Real a Lisboa é dada no nº 156 do Diário da Regência, 4 de Julho de 1821, edição de 4ª feira:

NOTICIAS NACIONAES.

Lisboa 3 de Julho

Repetidas Salvas das Fortalezas, do Castello, e Embarcações de guerra, annunciarão aos heróicos habitantes desta Capital a feliz chegada do nosso Rei Constitucional. S. M. entrou neste porto a bordo da Náo D. Joã VI seguida de outras embarcações de guerra e mercantes: tendo todos fundeado defronte da Cordoaria; transportou-se imediatamente a bordo a Deputação da Regencia do reino…

(Hemeroteca Municipal de Lisboa)

Notícia que faz referência ao Juramento da Constituição por D. João VI e consequente extinção da Regência do Reino é dada no Suplemento ao nº 157 do Diário da Regência, 5 de Julho de 1821, edição de 5ª feira:

LISBOA, 4 de Julho.

Artigos D’Officio.

AVISO.

As Cortes Gerais, Extraordinarias, e Constituintes da Nação Portugueza Declarão, e Decretão que, Tendo ElRei ratificado o seu juramento ás Bases da Constituição Politica que as mesmas Cortes fizerem (…) e fica  por tanto desde já extincta a Regencia do Reino, creada por Decreto de trinta de Janeiro do presente anno.

(Hemeroteca Municipal de Lisboa)


[1] Teve como antecedentes: a invasão de Portugal pelas tropas napoleónicas, em 1807; a transferência da corte portuguesa para o Brasil (1808-1821); a assinatura do Decreto de Abertura dos Portos às Nações Amigas, no dia 28 de janeiro de 1808 e o posterior Tratado de Comércio e Navegação assinado entre Portugal e a Grã-Bretanha em 19 de fevereiro de 1810; situação de miséria económica em Portugal, com fábricas em declínio, a agricultura em decadência, que levou a um colapso das rendas públicas e a miséria social.  Mas também contribuíram para esta Revolução Liberal do Porto, uma oposição à influência inglesa nos assuntos internos do Estado; a Conspiração de Lisboa de 1817; a fundação do chamado “Sinédrio”, integrado por alguns maçons, e que tinha como finalidade a consolidação do Exército Português no país; e a Revolução de 1820 na Espanha que restaura, em março, a Constituição de Cádis (1812), e que servia de exemplo para Portugal instalar os ideias do liberalismo. Veja-se VARGUES, Isabel Nobre – “O processo de formação do primeiro movimento liberal: a Revolução de 1820”. In MATTOSO, José (dir.) – História de Portugal, 5º vol.: O Liberalismo. Lisboa: Círculo de Leitores, 1993, pp. 45-63.

[2] CABRAL, Flávio José Gomes – “Vozes Públicas: as ruas e os embates políticos em Pernambuco na crise do Antigo Regime português (1820-1821)”. In SÆCULUM: Revista de História, nº13, (jul./ dez. 2005), pp. 63-64.

[3] BARRETO, Luiz do Rego – Memória justificativa sobre a conducta do marechal de campo Luiz do Rego Barreto durante o tempo em que foi governador de Pernambuco e presidente do governo da mesma província. Lisboa: Typ. de Desidério Marques Leão, 1822, p. 25.

[4] Carta do governador ao Ministério do Reino, 19 de dezembro de 1820. In BARRETO, Luís do Rego – Cartas Pernambucanas, vol. LII. Recife, 1979, pp. 156-157; BERNARDES, Denis – O patriotismo constitucional: Pernambuco, 1820-1822. Ed. Universitária UFPE, 2006, pp. 361-366.

[5] VENTURA, António – Uma História da Maçonaria em Portugal. Lisboa: Círculo de Leitores, 2013, p. 98.

Veja-se, inclusive, o Aviso dos Governadores do Reino em nome d’El Rei ao Presidente e Deputados da Real Junta do Commercio para “… mandar immediatamente bloquear o porto, e costas de Pernambuco e enviar um corpo das mesmas tropas, […] castigando os pérfidos, que se arrojáraõ a tramar taõ detestável traiçaõ”. In O Investigador Português em Inglaterra …, vol. XIX, nº LXXIII, julho de 1817, pp. 86-87 e, Conspiração Portugueza (artigo copiado do Times de 21 de junho de 1817). Ibidem, pp.108-109.

[6] MANIQUE, António Pedro – Portugal e as Potências Europeias (1807-1847). Lisboa: Liv. Horizonte, 1988, pp. 41-44.

 Entre 1820 e 1834 Portugal vai passar por um conjunto de mudanças de regime político e de governo, umas da responsabilidade dos liberais, outras dos absolutistas.

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Como referir este artigo:

Sendo um blogue com conteúdos de criação intelectual privada, estão protegidos por direitos de autor. Seja responsável na utilização e partilha dos mesmos!

VEIGA, Francisca Branco (2023),  Acontecimentos relevantes que promoveram o regresso a Portugal da Corte no dia 3 de julho de 1821 (blogue da autora Francisca Branco Veiga). Disponível em: https://franciscabrancoveiga.com/ [04 de Julho de 2022].

VEIGA, Francisca Branco, Companhia de Jesus. Companhia de Jesus.O Breve Regresso no Reinado de D. Miguel. Ed. Autor, 2023, 437 p. (Livro disponível na Amazon.es

7 SETEMBRO 1822, O BRASIL COMEMORA A SUA INDEPENDÊNCIA DE PORTUGAL

No dia 7 de setembro de 1822 , o Brasil comemora a sua independência de Portugal.

Notícias de Portugal

No dia 7 de setembro de 1822, o dia do «Grito do Ipiranga», dá-se o rompimento definitivo com o Brasil, mais um tema que serviu de controvérsia para os contrarrevolucionários, que pretendiam provar a inépcia do regime liberal. A obrigação imposta à Família Real de regresso à metrópole tinha sido seguida de medidas desastrosas por parte das Cortes portuguesas relativamente ao Brasil decretando o seu retrocesso à condição de simples colónia e limitando os poderes de D. Pedro no Brasil. Foi de um modo crescente que se desenvolveu uma onda liberal autonomista, com reivindicações das instituições representativas e simultaneamente anti portuguesas[1].

Deste modo, este acontecimento foi o tema eleito pelos críticos contrarrevolucionários que publicaram diversos artigos na imprensa periódica e em vários opúsculos. Exemplo disso foi o opúsculo Portugal e o Brasil. Observações Politicas aos Últimos Acontecimentos do Brazil, da autoria de Francisco de Alpoim Meneses, um dos principais agentes da conspiração da «Rua Formosa», que ao mesmo tempo que critica ironicamente sobre o assunto, pede aos Legisladores portugueses justeza e coerência na decisão a tomar:

“Infames Libelistas, em vez de prégarern a concordia, e inspirarem a confiança, tão necessarias nas crises politicas, vomitão venenosas invectivas, e insultão vergonhosamente, tanto ao particular tranquilo no centro da sua habitação, como á corporação acentada no tribunal das Leis, ou no da opinião publica! E que é isto? Não é já o estado das agressões, o da anarquia? E, assim que se consilião os espíritos, para os dirigir pela escrabrosa estrada da Liberdade?! E, assim que os homens hão de amar uma Instituição toda nova?” [2]

Manuel Fernandes Tomás, considerado por muitos a figura mais importante do primeiro período liberal, em 22 de fevereiro declarava:

“… se o Brasil com efeito não quer unir-se a Portugal, como tem estado sempre, acabemos de vez com isto; passe o senhor Brasil muito [bem], que cá cuidaremos da nossa vida” [3] .

Na opinião do miguelista António Ribeiro Saraiva, tinha sido o governo liberal britânico a levar os ideais liberais para as “Américas” estimulando, deste modo, a independência do Brasil:

“Seria pois necessário admitir que o Imperador do Brasil, ao tempo da morte de Seu Pai, não era um Soberano Estrangeiro, ou não era Soberano de um Estado Estrangeiro; isto seria dizer (o que eu sentiria muito) que o Brasil tinha sido tão nescio, que não haviares pondido à voz de M. Canning, quando este, tendo agasalhado em suas entranhas o embrião ou feto informe do Liberalismo transatlântico, chamava à existência e dava à luz a América (parturiuntmontes!) no meio do Parlamento Britânico, com grande admiração, de todos os néscios dos dois mundos!” [4].

A separação do Brasil iria pôr em causa o texto do Titulo II da Constituição – Da Nação Portuguesa, e seu Território, Religião, Governo, e Dinastia, Capitulo único, artigo 20:

“A Nação Portuguesa é a união de todos os Portugueses de ambos os hemisférios. O seu território forma o Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves, e compreende: I. Na Europa […]. II. Na América, o reino do Brasil, que se compõe das Províncias…” [5] .

Na Constituição seria referida «a União Real com o Reino do Brasil», ora não se conservando esta união do território, nem tão pouco a dos portugueses de ambos os hemisférios seria de absoluta correção a alteração da Constituição.


[1] LUCAS, Maria Manuela – “Organização do Império”.  In MATTOSO, José (dir.) – ibidem, pp. 290-292.

[2] MENESES,Francisco de Alpoim –  Portugal e o Brasil. Observações Politicas aos Últimos Acontecimentos do Brazil. Lisboa: Impressão Liberal, Rua Formosa N. 42, 1822, p. 9.

[3] ALEXANDRE, Valentim – “O processo de independência do Brasil”. In BETHENCOURT, Francisco; CHAUDHURI, Kirti (Org.) – História da expansão portuguesa,Vol. IV. Lisboa: Círculo dos Leitores, 1998, p. 619.

[4] SARAIVA, António Ribeiro – Eu não sou um Rebelde. Paris, 25 de fevereiro de 1828. [Consultado 25 out. 2015]. Disponível na internet em: <http://www.arqnet.pt/…/port…/documentos/ars_rebelde.html>. Este texto de António Ribeiro Saraiva foi escrito na época em que os Legitimistas tentavam explicar as suas posições aos governos da Europa.

[5] Constituição de 23 de setembro de 1822. In PARLAMENTO/Documents/CRP-1822. [Consultado 15 setembro 2014]. Disponível na internet em: <https://www.parlamento.pt/Parlamento/Documents/CRP-1822.pdf&gt;

In VEIGA, Francisca Branco – A Restauração da Companhia de Jesus em Portugal 1828-1834: O breve regresso no reinado de D. Miguel. Tese elaborada para obtenção do grau de Doutor em História, na especialidade de História Contemporânea, 2019.

Imagens:

– Independência ou Morte, por Pedro Américo,

Óleo sobre tela, 1888.

Exposta no Museu Paulista;

– Constituição 1822

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(NOTÍCIAS DE PORTUGAL)

Manuel Fernandes Tomás, considerado por muitos a figura mais importante do primeiro período liberal, em 22 de fevereiro declarava: “… se o Brasil com efeito não quer unir-se a Portugal, como tem estado sempre, acabemos de vez com isto; passe o senhor Brasil muito [bem], que cá cuidaremos da nossa vida”(1).

Na opinião do miguelista António Ribeiro Saraiva, tinha sido o governo liberal britânico a levar os ideais liberais para as “Américas” estimulando, deste modo, a independência do Brasil:

“Seria pois necessário admitir que o Imperador do Brasil, ao tempo da morte de Seu Pai, não era um Soberano Estrangeiro, ou não era Soberano de um Estado Estrangeiro; isto seria dizer (o que eu sentiria muito) que o Brasil tinha sido tão nescio, que não havia respondido à voz de M. Canning, quando este, tendo agasalhado em suas entranhas o embrião ou feto informe do Liberalismo…

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15 dezembro 1815, O Príncipe Regente eleva o Brasil à categoria de Reino

CRIAÇÃO DO REINO UNIDO DE PORTUGAL, BRASIL E ALGARVES

A notícia só é publicada em Lisboa em 1816, no nº 299 da Gazeta de Lisboa, 17 de dezembro de 1816, edição de 3ª feira:

«S. M. ElRei, meu Amo, fica sciente da resolução de S. A. R. o Principe Regente de Portugal, que V. Ex. me comunica em sua nota de 13 do corrente, pela qual  S. A. R. Houve por bem elevar o Estado do Brasil á dignidade de Reino, e uni-lo aos de Portugal e Algarves, de forma que componhão hum só e hum mesmo Corpo político, tudo em conformidade da Carta Régia de 16 de Dezembro próximo passado, de que me remete V. Ex. hum exemplar.

Renovo a V. Ex. com este motivo meus anteriores oferecimentos. Deos guarde a V. Ex. muitos anos. Palacio 19 de Março de 1816. B. A. M. – Pedro Cevallos. – Sr. Ministro de Portugal.»

D. João VI, Rei do Reino Unido de Portugal e do Brasil e Algarves.
Gravura de Charles Simon Pradier, a partir da pintura de Jean Baptiste Debret. 1817-1819.
Palácio Nacional de Queluz

7 SETEMBRO 1822, O BRASIL COMEMORA A SUA INDEPENDÊNCIA DE PORTUGAL

(NOTÍCIAS DE PORTUGAL)

Manuel Fernandes Tomás, considerado por muitos a figura mais importante do primeiro período liberal, em 22 de fevereiro declarava: “… se o Brasil com efeito não quer unir-se a Portugal, como tem estado sempre, acabemos de vez com isto; passe o senhor Brasil muito [bem], que cá cuidaremos da nossa vida”(1) .

Na opinião do miguelista António Ribeiro Saraiva, tinha sido o governo liberal britânico a levar os ideais liberais para as “Américas” estimulando, deste modo, a independência do Brasil:

“Seria pois necessário admitir que o Imperador do Brasil, ao tempo da morte de Seu Pai, não era um Soberano Estrangeiro, ou não era Soberano de um Estado Estrangeiro; isto seria dizer (o que eu sentiria muito) que o Brasil tinha sido tão nescio, que não havia respondido à voz de M. Canning, quando este, tendo agasalhado em suas entranhas o embrião ou feto informe do Liberalismo transatlântico, chamava à existência e dava à luz a América (parturiunt montes!) no meio do Parlamento Britânico, com grande admiração, de todos os néscios dos dois mundos!” (2)

 A separação do Brasil iria pôr em causa o texto do Titulo II da Constituição Da Nação Portuguesa, e seu Território, Religião, Governo, e Dinastia, Capitulo único, artigo 20:

“A Nação Portuguesa é a união de todos os Portugueses de ambos os hemisférios. O seu território forma o Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves, e compreende: I. Na Europa […]. II. Na América, o reino do Brasil, que se compõe das Províncias…”. (3)

 Na Constituição seria referida «a União Real com o Reino do Brasil», ora não se conservando esta união do território, nem tão pouco a dos portugueses de ambos os hemisférios seria de absoluta correção a alteração da Constituição.

No dia 25 de março de 1824, D. Pedro I, Imperador do Brasil, outorga a primeira Constituição brasileira. A Constituição Imperial vigorou 67 anos, de 1824 a 1891, quando foi promulgada a primeira Constituição Republicana, sendo, deste modo, a constituição brasileira que teve a vigência mais longa. A Carta outorgada em 1824 foi influenciada pelas Constituições francesa de 1791, espanhola de 1812 e a portuguesa de 1822.

Juramento de D. Pedro I, Imperador do Brasil, à Constituição de 1824

Dois anos mais tarde, no dia 29 de abril, após a morte de D. João VI, D. Pedro outorgava, em Portugal, a Carta Constitucional, inspirada no modelo brasileiro.

(1) ALEXANDRE, Valentim – “O processo de independência do Brasil”. In BETHENCOURT, Francisco; CHAUDHURI, Kirti (Org.) – História da expansão portuguesa, Vol. IV. Lisboa: Círculo dos Leitores, 1998, p. 619.

(2) SARAIVA, António Ribeiro – Eu não sou um Rebelde. Paris, 25 de fevereiro de 1828. Este texto de António Ribeiro Saraiva foi escrito na época em que os Legitimistas tentavam explicar as suas posições aos governos da Europa.

(3) Constituição de 23 de setembro de 1822. In PARLAMENTO/Documents/CRP-1822. [Consultado 15 setembro 2014]. Disponível na internet em: https://www.parlamento.pt/Parlamento/Documents/CRP-1822.pdf

In VEIGA, Francisca Branco – A Restauração da Companhia de Jesus em Portugal 1828-1834: O breve regresso no reinado de D. Miguel.  Tese elaborada para obtenção do grau de Doutor em História, na especialidade de História Contemporânea, 2019.

Independência ou Morte, por Pedro Américo
 Óleo sobre tela, 1888
Exposta no Museu Paulista
Constituição de 23 de setembro de 1822
PARLAMENTO/Documents/CRP-1822
Disponível na internet em: https://www.parlamento.pt/Parlamento/Documents/CRP-1822.pdf
Constituição Política do Império do Brasil, primeira página
Arquivo Nacional do Brasil (AN)